Dona Aurora (reeditado)
Ela estava parada em frente a janela, a xícara de café estava suspensa entre o pires e a boca. O que via do lado de fora a fizera esquecer de sorver o café. Queria ouvir o que aquele casal conversava. Mas a distância só permitia que ouvisse algumas palavras avulsas.
A mulher gesticulava muito e o homem parecia ouvir algum caso complicado. Ele franzia a testa a todo momento.
De modo brusco o homem se vira, passa as mãos pelos cabelos e descobre o olhar de dona Aurora. Essa pousa a xícara no pires, coloca sobre a mesa e fecha as cortinas.
A cidade era pacata. Quem movimentava mesmo, eram as mexeriqueiras. E logo alguma delas haveriam de dar notícias daquele casal.
Logo dona Aurora se esqueceu da cena que vira da janela. Lavou roupa e as estendeu no varal do quintal, arrumou os quartos, fez o almoço. Os filhos e o marido vieram para o almoço, depois voltaram para seus trabalhos.
A noite quando se sentou para ver a novela ouviu um ruído estranho na porta da cozinha. Perguntou ao marido se ouviu alguma coisa, mas este cochilava no sofá. A filha estava estudando no quarto, perguntou a ela se ouvira algum barulho estranho e ela respondeu que deveria ser os gatos da vizinhança; o filho ouvia música com seus fones de ouvido na sala ao lado do pai.
Logo mais a casa toda dormia.
De manhã quando dona Aurora abriu a janela, antes que tomasse o café, viu novamente o casal em frente a casa dela. Passou a observá-los mais discretamente, não queria ser descoberta como no dia anterior. O casal parecia mais calmo e conversavam normalmente.
Dona Aurora notou que a mulher vestia um vestido igual a um que possuía. Pensou ser aquela mulher de muito bom gosto.
No domingo quando toda a família estava em casa contou o ocorrido para eles. Mas ninguém se interessou pelo que ela dizia. Nesse mesmo dia ela viu que o homem usava uma roupa igual ao de seu marido e comentou com ele.
– Esse casal tem o gosto muito parecido com o nosso. Outro dia a mulher se vestia com um vestido igual ao meu e hoje o homem está com uma roupa parecidíssima com a sua. O marido deu de ombros. O filho perguntou a mãe onde ela pusera sua vara de pescar.
– Ora essa, no lugar de sempre. Aliás aquele homem está levando uma vara de pescar igualzinha a sua. E a mulher usa sapatos de camurça azul iguais ao de sua irmã.