FESTINHAS CURITIBANAS

Que saudades das festinhas curitibanas! Quem é da minha época sabe do que estou falando. Quase todo fim de semana pintava pelo menos uma festinha pra toda a patota, e de vez em sempre surgia um aniversário de 15 anos, com a anfitriã imaculadamente vestida de branco e com direito ao ‘bolo vivo’, composto por quinze casais segurando velas para serem apagadas - com todo o charme do universo - pela aniversariante, enquanto rodopiava uma linda valsa nos braços do orgulhoso papai.
Nos anos dourados da década de 1960, as festinhas eram promovidas nas próprias casas. Nada de alugar espaços, elas aconteciam na área social do lar. Apenas o pessoal mais endinheirado reservava salões nos clubes elegantes, com a justificativa de que o grande número de convidados exigia um lugar maior. Mas o bom mesmo eram as festas nas residências, principalmente para quem buscava um namoro que conduzisse a um bem sucedido casamento. Quando existia uma paixão inicial, a presença de um pai honrado, de uma mãe gentil, e de irmãos compatíveis com a gente, era tudo que bastava para escancararmos a porta do coração à pretendida, que se tornava mais cobiçada ainda quando resguardada e acarinhada por uma família feliz.
Nas chamadas ‘festas americanas’, as moças levavam doces e salgados, e a rapaziada as bebidas: refrigerantes, gengibirra e gasosa vermelha da Cini. Quando os pais reputavam como confiáveis os mancebos presentes, liberavam uma ou duas garrafas de rum ou vodca, para que fossem diluídas em ínfimas, exíguas, apoucadas, diminutas e irrisórias doses à coca (cuba libre) ou crush (hi-fi). Pra ficar tonto com aquelas misturas...só mesmo tomando em baldes!
Era permitido levar amigos como convidados extras, desde que com prévia autorização da anfitriã e em pequeno número (dois ou três), adequadamente vestidos e com bons antecedentes criminais...hehehehe! Sim porque se um deles fizesse alguma burrada ou safadeza, não somente ele queimava o filme “ad aeternum”, como também quem o levou. Não raramente, a moçada chegava com um violão para cantar em grupo, e por vezes acontecia um interessante jogo de mímica, onde equipes competiam entre si ao encenar - sem palavras - o nome de um filme famoso ou algum provérbio tipo “Nem tudo que reluz é ouro”, ou “Quem ama o feio, bonito lhe parece”, enquanto seus parceiros tinham um escasso tempo pra tentar adivinhar. Depois dessas atividades, acontecia o mais aguardado: um gostoso bailinho, ao som das músicas românticas da época, reproduzidas em vitrolas tipo ‘pick-up’, que deixavam cair um a um os LPs empilhados em uma haste engastada no centro do ‘toca-discos’, alguém se lembra disso?
Muitos namoros e casamentos começavam em festinhas assim. Quando pintava um clima e o par se acertava, marcavam encontro para o próximo domingo na casa da moça, onde ficavam flertando no jardim ou no portão, sob os olhares atentos da mãe extremosa e do pai coruja, e por vezes sob o olhar irado de algum irmão ciumento, como que dando o recado: _”Passe do limite com ela e você vai ver o que te acontece!”.
No término das festinhas curitibanas, lá pelas duas da madrugada, era comum juntar os amigos pra esticar a noite fazendo serenatas, tomando uma sopinha no Palácio, comendo um sanduíche no Cachorro, ou estacionando no Tipiti-Dog para ser servido no automóvel com um suculento, delicioso e calórico sanduíche, recém-criado em Curitiba, e que depois foi imitado em todo o Brasil: o cheese-salada!
As festinhas nas casas terminaram pela ação de agourentas turmas da cidade, desajustados mal resolvidos que chegavam sem convite e faziam a maior esbórnia. Nos banheiros, espalhavam pasta de dente, escreviam besteiras com batom nos espelhos, e entupiam propositadamente o vaso sanitário. Não satisfeitos, muitas vezes punham fim à festa puxando briga com a rapaziada convidada. A possibilidade de invasão e violência dentro do próprio lar começou a gerar pânico nos pais curitibanos, que por este motivo passaram a promover suas festas familiares nos clubes e associações da cidade.
(Marco Esmanhotto)
Marco Esmanhotto
Enviado por Marco Esmanhotto em 26/09/2020
Reeditado em 26/09/2020
Código do texto: T7072769
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2020. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.