“Raciocine!”
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Na faculdade tínhamos um professor, de origem italiana, que nos dava aulas de Cálculo. Estudava eu Engenharia Civil, os semestres iniciais, em que o quê aprendêramos na escola juntava-se às matérias especificas da área. Tudo novo e velho ao mesmo tempo.
Esse mestre, de sobrenome Sonino e nome Sérgio, falava carregadamente, tipicamente ítalo-brasileiro. Dizia-se que ele trabalhara na NASA. Um crânio!
Nossa turma era a escória da escória das turmas, uma junção dos repetentes e de novos alunos. Tinha aluno de várias turmas, eram numeradas pelo ano de entrada, tais como 5.000, 6.000. Sete mil era a minha. Até hoje guardo o número de matricula: 7104. Aliás, o número sete e seus múltiplos me acompanham desde a época de escola, onde fora o número 14, múltiplo de sete, e aparecem em várias outras ocasiões também, me acompanham. Sinal de quê?
Nossas aulas eram em uma classe anfiteatro, como um cinema, as cadeiras dispostas em filas e em degraus, com as portas de acesso aos fundos, local em que eu sentava para sair mais fácil das aulas chatas. Bem abaixo da entrada, ficava a lousa em um patamar em madeira para o professor ministrar suas aulas. A turma girava em torno de 150 a 200 alunos. Ouvia-se uma turba de conversas, risadas e brincadeiras de jovens em seus irresponsáveis vinte e poucos anos.
Uma perfeita torre de Babel.
Era início dos anos setenta, usávamos cabelos compridos, calças boca de sino, camisas estampadas abertas no peito, época das mudanças sociais e comportamentais. Era uma época mais romântica, muita coisa ainda a descobrir, havia encanto e mistério na vida!
Nesse dia, a sala estava lotada e o nobre professor de Cálculo ministrava sua aula, desenvolvendo um exercício para demonstrar a matéria. Falava baixo, eu quase não entendia nada, por causa do seu sotaque, da distância e da classe totalmente desinteressada que nada acompanhava.
Em dado momento, com o giz na ponta dos dedos, vira-se para a plateia, encara um dos alunos que conversava desenfreadamente com o colega e lhe diz com seu português italianado:
-"Ei ragazzo, vieni qui resolver questo problema! "
O colega chamado o encara de olhos arregalados, boca aberta, virando a cabeça para os lados como se perguntando, " é comigo? "
-"Si, tu de camisa rossa, vermelha, vieni qui!
Toda a sala, agora quieta, olha "pra" ele, que se levanta espantado e atônito caminhando em direção ao mestre. Este o encara, dá-lhe o giz, um tapinha nas costas, de estímulo, e diz:
-Resolva o problema!
Por instantes o mundo parou para o aluno, que com o giz na mão encarava a lousa com aquela fórmula ininteligível para ele e para nós. Ficou minutos ali, estático, com a classe muda ou sem qualquer outro ruído. Todos, em suspense, aguardavam o que aconteceria.
Então, "Seu Nino", como o apelidáramos, se aproxima, lhe bate nas costas e diz:
-"Experimenta una nouva sensazione, RACIOCINE! "
Ao escutar essa frase, a sala silente irrompeu em gargalhada, inclusive o colega, quebrando assim o gelo e o clima de tensão.
Sua tirada fora genial e depois desta sua intervenção de humor inteligente e ferino, assistia a quase todas as suas aulas.
Grande "Seu Nino"! Já se foi infelizmente, deve estar junto das estrelas.
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