"Oi"
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-Minha prima me deu um "Oi" hoje no "whats". - diz minha mulher sentada comigo na varanda do nosso chalé. Admirávamos o final do dia.
-Ah é! -respondo.
-Sim, faz anos que não nos falamos ou vemos. É um pouco mais velha que eu.
-E porque ela te acionou?
-Não sei. Deve ser por que estou com minha irmã e uns primos cuidando da nossa arvore genealógica. Ela faz parte do nosso grupo da família no "zap".
-Ainda bem que não é ginecológica! - brinco com ela, que ri.
A tarde findava e havia chovido no alto mar, formando agora um arco íris com o sol poente, quase que um semicírculo perfeito. Linda a vista.
-Veja que belo arco íris esta se formando! - aponto.
-Sim, lindo!
-Sabia que se você conseguir chegar a uma das pontas dele encontrará um tesouro!
-Sei, sei. Deixa de lorota Fernandinho!
-E a árvore "ginecológica" para que estão fazendo?
- A "mana" quer obter a cidadania para o filho. Um primo nosso obteve. Sabe aonde?
-Não.
-Luxemburgo!
-Mas vocês são filhos, netos de alemães? Como?
-Não sei. Por isso estamos fazendo.
- E a prima do "Oi"?
-Então, ela só me deu um "Oi", nada mais! Achei estranho.
-Por quê?
-Faz muitos anos, mais de quatro, cinco que não nos falamos e agora ela me procura! Acho que deu saudades.
-Sei... - absorto com o arco íris, que agora começava a dissipar o meio do seu semicírculo junto às nuvens, mas as pontas seguiam firmes, uma no mar, a outra no costão. Pensei que, se conseguíssemos chegar até o costão, o tesouro estaria lá. Minha mulher seguia, longe, com a história da prima do "Oi".
-... lá onde eu nasci, íamos eu e ela colher araticum. "Eu subia nas arvores e ela ficava embaixo, me dizendo: "olha aquele ali, tá madurinho, aquele outro..." e a tonta aqui fazia tudinho o que ela dizia. Que situação! - essa fala é sua característica, sempre diz em situações desconfortáveis.
- Ahã... - seguia eu focado no arco íris.
-Imagine você, que ao descer do pé de araticum, com eles empilhados para dividirmos, ela me dizia: "vamos dividir "irmanadamente" - dois pra mim, um pra você!". Que situação!
-Sei,..sei... - o arco íris agora estava somente com dois pedaços extremos, os das suas pernas, e uma delas permanecia no costão. O tesouro ali, a nossa espera!
-Eu ficava injuriada e fechava a cara dizendo: "Não senhora! Um pra cada um!". Ela ria da sua brincadeira.
-..hã... - o arco íris agora se esmaecia com a tarde quase noite.
-A reencontrei na festa dos meus cinquenta anos, estávamos separados eu e você, e ela estava bem envelhecida. Faz quatro anos.
-... sei... - o bendito do arco íris agora somente com a sua perna no costão, como que me dizendo: "venha, venha antes que anoiteça, pegar o tesouro!".
-Minha irmã me disse que ela esteve muito doente, coitada.Quase morreu.
-Ela morreu? - pergunto de chofre, voltando à conversa, assustado.
-Como morreu Fernadinho! Ela me mandou um "Oi" hoje! Que situação? Onde você estava?
Comecei a rir e ela também e ficamos gargalhando sem parar por um bom tempo, pois foi hilária a situação do meu esquecimento senil.
A "melhor" idade é uma merda!
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