Lutadora
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Íamos, a uma feira de revestimentos cerâmicos em um carro de aplicativo que meu "chefe" e amigo chamara. Ele, sentado atrás, eu, no carona ao lado da motorista.
Ela, devia estar em seus mais de trinta e cinco anos, talvez quarenta, envelhecida. Tinha cabelos escuros e olhar triste e cansado mesmo ao sorrir. Pessoa de vida pesada!
Cumprimentara-a ao entrar e agora começo a conversar. Sou curioso, gosto de escutar as histórias de vida das pessoas e quando são interessantes, de escrevê-las.
- Como está "a praça"? - pergunto-lhe.
- Vamos indo. Sobrevivendo! - responde sem convicção. Meu amigo, alheio a nossa conversa, ia atento ao seu celular.
- Sim, como todos nós, não? Faz tempo que está neste ramo?
- Uns seis meses. Estou usando o carro de um amigo que está me ajudando.
- Recente então.
- Sim, fui obrigada, pois meu marido me deixou com nossos três filhos. Fugiu com a minha melhor amiga!
- Que coisa!
- Fui com elas visitar minha mãe em Minas e ao voltar a casa estava vazia.
- E quem cuida dos seus filhos? Tem alguém?
- Não! A mais velha cuida dos dois menores.
- Qual a idade dela?
-Treze.
- Quanta responsabilidade para sua filha! É uma criança ainda.
- Sim, mas temos que enfrentar os problemas que temos com o que temos, não é mesmo? A vida segue e ela vai aprendendo.
Calei-me. Sua franqueza bruta e direta mostrava quão pesada era a sua existência. Seu semblante não escondia a dureza implacável que carregava nos ombros. Fiquei com pena. E, apesar de tudo, não reclamava de nada, sua fala era como um comentário simples, direto e objetivo: sua vida, sua cruz, nada mais! Conformada! Não sei se teria a mesma força. Admirei-a!
- E para ajudar, acabei de saber que estou com câncer na tireoide. Estava chorando até agora, antes de pegá-los.
Pensei em o quê responder.
- Olha! Esse tipo de câncer tem cura. Soube de várias pessoas que descobriram que o tinham e se curaram. Não é tão agressivo - disse, tentando confortá-la.
- Eu sei, mas vou ter que ficar três meses em tratamento. E como pago as minhas contas? Não posso ficar sem trabalhar! E minhas filhas?
- Não pode deixá-las com os seus pais em Minas?
- Ah, somos muito unidas e não nos separamos por nada. Elas não iriam querer ficar longe, nem eu.
Meus argumentos se esgotaram e novamente me calei. Seguimos mudos. Meu amigo no banco de trás continuava entretido com o seu celular.
- Chegamos! - diz, com o seu sorriso baço nos lábios.
- Grato pela viagem. E força, sei que vai vencer mais essa etapa de sua vida, junto com seus filhos. Vocês são vencedores! - digo, apertando-lhe a mão forte e calejada, emocionado.
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