As visitas inesperadas.
Guilhermina e a filha estão com dificuldades de arrastar as malas pelas ruas de pedras irregulares. Iam e vinham buscando seus pertences na antiga casa. Os passeios muito estreitos não davam para transitarem com toda aquela bagagem. Tudo que possuíam, resquícios dos tempos abastados, estavam ali naquelas malas.
Procuravam por uma pensão que pudessem se hospedar por alguns dias. O dinheiro não seria suficiente nem para um mês de estadia.
Uma pessoa indicara um local adequado para que elas passassem uns dias a preços módicos.
Enfim se instalaram no quarto amplo com banheiro. Mas Guilhermina que até há pouco tempo não se preocupava com o preço das coisas, agora se via em grandes dificuldades financeiras, fazia planos com a filha para que pudessem levar uma vida menos requintada, mas confortável. Essa situação que viviam era consequência dos intensos gastos com festas, viagens, roupas caras, bons vinhos e tudo que podiam pagar sem preocupação, mas com o tempo, o que herdou do marido foi sendo dissolvido na vida boa. Nunca procurara se empregar, nem ela e nem a filha e tudo foi consumido em suas mordomias.
Nunca estreitou relações com os parentes e agora não via como pedir lhes ajuda. Lembrou se então de um primo distante que havia se mudado para o interior após se casar com uma moça que se negara a se mudar para a cidade grande. Viu nessa possibilidade uma garantia de viverem bem por algum tempo. Não conhecia o lugar, nem as acomodações, mas soube que o primo vivia bem.
Partiriam em uma semana. Diriam ao primo que estavam de férias e resolveram visitá-los.
Uma semana depois estavam a caminho do novo domicílio, assim pensavam em se instalar por lá definitivamente, mesmo que o primo não soubesse da intenção delas. Fariam o sacrifício de levar uma vida pacata.
A pequena vila as surpreendeu logo na chegada. A beleza natural do local era de encher os olhos. Assim que o ônibus atravessou a ponte, avistaram um corredor de árvores floridas que elas não sabiam o nome. De plantas não entendiam nada. Mas não ficaram indiferentes ao espetáculo da natureza. Como não havia rodoviária, o ônibus tinha parada em frente a um comércio de variedades, onde havia em frente uma tabuleta com o nome do estabelecimento: “Armazém do Tião”. Resolveram entrar e se informar onde ficava o endereço do primo.
Seu Tião as atendeu com presteza. Com seu cigarro de palha no canto da boca, indicou onde era a casa do primo. Elogiou a família, gente muita quista na cidade. Haveriam de ser muito bem recebidas.
As duas que contara com a ajuda de outros passageiros para descerem as malas, perguntaram ao dono do armazém onde encontrariam uma condução para levá-las a casa do primo. Mandou chamar Ezequiel, o funcionário, que veio prontamente. – Leve as senhoras a casa do Luiz da Maria do Céu.
Partiram e em cinco minutos desembarcavam à porta da casa dos parentes. Tentaram gratificar o rapaz que se negou a receber. Parentes do seu Luiz eram amigos dele e do patrão.
Bateram uma, duas, três vezes, e foram atendidas por uma simpática senhora.
– Pois não! O que desejam!
– Falar com o primo Luiz. Ele está?
– Sim, mas quem são?
– Somos parentas dele! Primas!
– Entendo. Então vamos entrando. Entraram e a bagagem permaneceu na calçada.
Vieram o primo e a esposa. De pronto ele não as reconheceu. Os anos e as poucas vezes que se viram, deixaram-no encabulado.
Mas Guilhermina manteve o sorriso e relembrou as poucas vezes que esteve com o primo e os pais dele. Disseram que vieram visitá-los. Educadamente ele apresentou-as a esposa, e ela a filha. Foram convidadas a se sentarem. Ela e a filha fizeram um rápido apanhado da sala da casa com os olhos. Conversaram, a esposa pouco, o primo um pouco mais. Aí se lembraram das malas que haviam ficado na calçada junto a Ezequiel, que se propôs a esperá-las até que viessem dar-lhe permissão para carregá-las para dentro de casa.
Maria do Céu e o marido trocaram olhares. Acompanharam as primas até a frente da casa. E houve um momento de tensão. O casal parecia espantado. Quem visse o semblante deles diria que estavam chocados. Ao todo eram doze malas. Muito, para quem veio de visita.
O casal permaneceu parado, de olhos fixos nas malas.
Continua...