Conto das Terças-feiras – Desrespeito para com os turistas

Gilberto Carvalho Pereira

Fortaleza, 8/09/2020

Depois de um período de estágio na Georg-August-Universität Göttingen, na Alemanha, pelo SHIFT - Studies on Human Impact on Forests and Floodplains in the Tropics (Estudos sobre o impacto humano sobre florestas e várzeas nos trópicos, em convênio), deixamos a cidade de Göttingen. Convênio de cooperação entre governo Alemão e Brasileiro, fazendo parte a Embrapa e a Faculdade de Agronomia do Pará, Fcap,

Lembrando que havia prometido à minha noiva, alguns anos antes, que o nosso casamento só seria possível quando tivéssemos condições de passar a nossa lua de mel na Alemanha, promessa cumprida ao completarmos 25 anos de casados, bodas de prata. Relembrança que vem, por termos completado, recentemente, 50 anos de casados.

Saímos de Göttingen às 11h40, do dia 2 de março de 1995, de trem. Ao deixarmos a fronteira da Alemanha com destino a Zurique, todo o comissário de bordo foi trocado e os preços das mercadorias/lanches foram alterados. Um refrigerante, que custava 2 DN (marco alemão), passou a custar cinco dólares, evidenciando a diferença do custo de vida entre os dois países. Chegamos à Zurique às 19 horas do mesmo dia. O hotel foi escolhido em um painel luminoso colocado na praça da estação, que abrigava um mapa da cidade e pequenas lâmpadas indicando quais os que ainda tinham apartamentos disponíveis, e assim era feita, imediatamente, a reserva pelo número do passaporte e procedência. Um táxi levou-nos a nosso destino, onde nos atendeu uma recepcionista portuguesa, por sinal, muito educada. Pagamos o primeiro pernoite, fomos dormir e, na manhã seguinte, descemos cedo para tomar café da manhã e conhecer a cidade. Ao passarmos pela recepção foi-nos perguntado se continuaríamos mais um dia. Respondemos que se demorássemos, ficaríamos mais uma noite.

Visitamos o lago Zurique, onde tiramos várias fotografias, a igreja protestante Großmünster, de estilo românico, o centro da cidade e outros lugares interessantes. Almoçamos em um restaurante no centro da cidade, do qual não lembro o nome, experimentando o famoso Rösti, bolinho achatado de batatas cozidas com casca, ou fritas na manteiga e recoberto com ovo frito. Satisfeitos e um pouco cansados pela viagem do dia anterior e pelas andanças a pé pela cidade, voltamos ao hotel. Passava das 18 horas. Ao solicitar a chave do apartamento fomos informados que nossas roupas e objetos estavam ali, as malas completamente abertas e roupas expostas. A motivação para esse ato foi não termos voltado antes das 14 horas. Naquele momento o hotel encontrava-se lotado, pois estava havendo um festival de vinhos e queijos na cidade com muitos participantes. Sabíamos que a recepcionista portuguesa entendia muito bem o que falávamos. Dissemos que aquilo era um absurdo, pois já havíamos deixado uma diária paga e um recado sobre o nosso retorno, isto é, se não retornássemos antes das 14 horas, permaneceríamos por mais uma noite. Ela insistia que não havia mais vaga, que procurássemos outro hotel.

Revoltada, minha esposa, falando alto, chamando a atenção dos hóspedes, gritava:

— Isso é invasão de privacidade. Isso é crime! Também é falta de urbanidade para com os turistas.

— Senhora, vocês foram avisados que se não voltassem cedo, a vaga seria ocupada.

— Ninguém falou da possibilidade de o hotel lotar, ou que estava havendo esse festival hoje.

— Mas nada posso fazer - disse a recepcionista.

— Então vocês terão que conseguir um hotel para nós dois. Caso contrário, dormiremos aqui nessas cadeiras - apontando para dois sofás no lobby do hotel.

A recepcionista, preocupada com a atitude tomada por minha esposa, pegou o aparelho telefônico e começou a discar, procurando vagas nos hotéis próximos. Depois de quase 15 minutos tentando, ela virou-se para nós e disse:

— Conseguimos uma vaga em um hotel bem próximo daqui. Nosso funcionário irá levá-los, e ajudará a carregar suas malas.

Transportávamos seis malas, duas grandes e quatro médias, resultado de roupas de frio, souvenires, perfumes e presentes, comprados em várias cidades da Alemanha. Ainda havia vaga para os que seriam comprados em Milão e Roma. Felizmente o hotel era melhor que o outro, um pouco mais caro. Na manhã do dia seguinte rumamos para Milão. No trem fomos abordados pela quantidade de malas que carregávamos, queriam saber sobre mercadorias ilícitas. Um oficial pediu para ver meus documentos. Percebendo que eu nascera em São Paulo disse ter irmão morando lá. Desejou-me boa viagem e se foi. Atravessamos os Alpes Suíços, paisagem deslumbrante! Avistamos atletas e amadores descendo as geleiras em seus velozes esquis.

Ficamos dois dias em Milão, em casa de uma amiga de nossa filha. Casal bastante agradável, ela peruana e ele milanês, nos brindaram com belos passeios e um jantar em restaurante de comida típica tailandesa, muito apimentada.

Dois dias depois seguimos para Roma, de trem novamente. Deixamos nossas seis malas em Milão, para apanhá-las na volta. Visitamos o Vaticano, vimos o Papa, fizemos city tour, passeamos pela Via Ápia e o nosso retorno para o Brasil se deu em 10 de março de 1995. Em casa encontramos todos bem, viramos avós pela segunda vez, dois dias depois.

Gilberto Carvalho Pereira
Enviado por Gilberto Carvalho Pereira em 08/09/2020
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