“No creo en brujas, pero que las hay, las hay”
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Fazia um belo dia do "veranico" de inverno que se implantou por aqui nesses dias de julho. O céu estava limpidamente azul, a brisa fresca e agradável e o sol ameno. Caminhávamos, eu e minha mulher, pela praia quando observo ao longe dois homens de cócoras no chão com alguma coisa os entretendo, despertando a minha curiosidade no nosso passeio.
De repente, ouço um som agudo e vejo um aeromodelo voando e fazendo acrobacias no céu, sob o comando de um deles. Dia ótimo para isso! Havia poucas pessoas na praia e a maré baixa proporcionava uma grande extensão de areia para decolar e aterrissar. Enfim, perfeito para os marmanjos brincarem com os seus brinquedinhos com muito espaço.
Continuamos em direção aos pilotos, chegando próximos, mas passando distante por causa da pandemia e vi que tinham alinhados vários "aviõezinhos", ou melhor, aeromodelos. Dentre eles, havia um "Paulistinha" (monomotor de asa alta, um dos primeiros aviões fabricados em nosso país, nos anos 50, para treinamento, usado por muitos anos para a formação de pilotos); outros monomotores de asa baixa; um drone e um caça a jato F-15 (deduzi pela sua configuração e desenho, com dois lemes traseiros e asa em delta, maior que os demais estacionados na areia). Estavam eles muito bem equipados para muitas acrobacias e diversão.
Vendo esses modelos, lembrei-me da minha época de garoto em que montava miniaturas de aviões da marca Revell. Comprava-os em um armarinho perto de minha casa com a mesada que recebia do meu pai, o dinheiro que conseguia engraxando seus sapatos e outras tarefas da casa que arrumava para tanto. Namorava os Spitfires ingleses, os Zeros japoneses, os Foker Wulf alemães e outros modelos expostos em suas caixas reluzentes e convidativas na pequena vitrine da lojinha. Ficava muito feliz quando conseguia comprá-los. Passava horas no quartinho de passar roupas, nos fundos de nossa casa, entretido e absorto nessas montagens e ao terminá-las, era pura felicidade pela conquista. Uma delícia!
Um dia, naqueles tempos de meninice, fui de carro com meu pai ao Parque do Ibirapuera e passamos pela pista de aeromodelismos junto da avenida. Embeveci-me pelo voo dos aviõezinhos barulhentos conduzidos pelos pilotos. Ficavam no centro de um grande círculo de piso cimentado, com o comando por cabos em suas mãos, subiam, desciam, faziam looping e outras manobras com aqueles brinquedinhos estridentes, demonstrando terem grande habilidade e controle. Um espetáculo a ser visto.
Curioso, fui ao Google procurar a situação atual desse local de minha infância e encontrei o seu nome hoje: Modelódromo do Ibirapuera. Novos tempos, novos nomes, nova tecnologia. Hoje não há mais os comandos por cabos, somente por controle remoto.
Voltando aos marmanjos pilotos na praia, acordado pelo mesmo zunir do motorzinho dos tempos de garoto, vi que aterrissou levemente na areia o monoplano que eu acompanhava com os olhos.
Agora, observo o outro piloto pegando o caça F-15. Aguardo curioso.
Posicionou o aeromodelo na areia e acionou o seu motor: o som era diferente, mais grave, parecendo ser de uma turbina em miniatura mesmo. O brinquedinho andou um pouco à frente e começou a virar, mas via-se que estava desgovernado. Seu dono não conseguia mudar a direção através do controle remoto que manuseava para fazê-lo correr e decolar: andou em círculos e encalhou na areia fofa. Estava com algum problema de funcionamento. Sempre acontece com esses lindos e delicados brinquedos. Parece que os seus aficionados passam mais tempo consertando-os, do que propriamente pilotando os bichinhos. Talvez essa seja a diversão de fato. Acompanhei o F-15 sendo trazido para o meio da praia, seu piloto mexeu em sua asa e em seus lemes traseiros colocando-o com cuidado na areia para reiniciar o seu voo.
Ao mesmo tempo, surgiu na praia um quadrículo. Era do monitoramento das condições ambientais do local, faz periodicamente essa verificação. Ia lentamente em direção ao modelo prestes a decolar um pouco à frente. Preocupei-me e pensei: vão bater!
O piloto não notou esse quadriciclista ambiental, estava de costas e acionou o jato, que novamente virou à direita desgovernado, indo exatamente contra o veículo, que ainda se movia lento. O impossível aconteceu: bateram como previ!
Foi incrível, com uma praia enorme, larga e livre ocorrer esse acidente. Inacreditável! Foi como se se atraíssem, magnetizados mutuamente. Inexplicável!
O piloto do aeromodelo pegou o jato com um gesto brusco, certamente danificado pelo choque com os grandes e largos pneus do veículo. Deve ter dito alguns palavrões para o da moto que continuou sentado e estático. Deduzi pelos gestos, já que da distância que estávamos e com o marulho do mar e o zoar do vento, não se ouviam suas falas.
Seguimos a nossa caminhada matinal pela praia. Ia pensando no acontecimento inacreditável e sem explicação que presenciei e pensei :"No creo en brujas, pero que las hay, las hay". Será ?
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