Minha primeira hóstia

Stava lendo Mozaniel enquanto o pão integral assava no fogão e comia sua saborosa escrita com um gosto de favo de mel ao paladar, de tão agradável que são seus escritos. Bem simples e bem natural.

O padre dele era Padre Pedro e o meu é padre Felipe.

Padre Felipe era italiano ou espanhol, nem lembro mais a nacionalidade do "santo" que para mim era mesmo um santo, pois sempre o via metido numa batina mais alva do que a cor branca e uma tia de minha mãe, tia Ritinha, tinha o merecimento de lavar as batinas do padre vez em quando, para ela era um favor que fazia ao céu sem esperar nada em troca só mesmo pela satisfação de fazê-lo.

Eu, minino, na década de 70, só via o padre na igreja de nosso interior e quando me entendi por gente o padre vinha a cavalo por 13 quilômetros que distava da matriz à nossa humilde igrejinha de Nossa Senhora da Conceição.

Como sempre o via apenas na igreja ou chegando por lá, imaginava que o padre estava sempre de batina fosse na igreja ou noutro canto qualquer o que foi para mim a maior decepção da minha vida religiosa ver o padre Felipe de calça e camisa como um homem comum. Perdeu o encanto e perdi a enorme admiração tamanha foi a decepção. Para mim um homem daquele só podia estar dentro daquela batina que o diferenciava dos outros homens e me inspirava ou me aproximava mais de Deus.

Pois bem. O fato é que na igreja tinha aquele momento das pessoas fazer as preces lendo ou falando mesmo sem ler e minha mãe me deu alguns papeis escritos algumas preces para eu dizer no meio dos grandes e ouvir em coro o "Senhor atendei às nossas preces."

Não sei o meu tamanho nem a idade, mas algumas pessoas se admiravam de minha intrepidez na leitura mesmo sem estudar regularmente.

Mas, nossa personagem nunca aprendera o português brasileiro e falava enrolado demais eu mesmo nunca entendi suas missas, seus sermões, nem ele falando comigo não conseguia decifrar.

Um belo dia estava o padre distribuindo a vítima (hostiam etimologicamente ou hóstia, ou simplesmente o corpo de Cristo), e como não era muita gente na igreja o padre passou de banco em banco e ao se aproximar das pessoas elas lhes estendiam as duas mãos uma sobre a outra para receber o corpo do falecido Cristo, simbolicamente, claro, quando se aproximou de mim fiz o mesmo gesto que todos e lhe estendi às mãos na mesma diligência dos adultos. O padre, que sabia que só podia comungar após a primeira comunhão me perguntou 3 vezes, no seu português inelegível, se eu já tinha feito a primeira comunhão. Enquanto o padre distribuía a igreja cantava um hino que nem lembro mais a letra e ainda bem para que não a rezasse por aqui, porém na terceira vez eu entendi mais ou menos a pergunta e respondi positivamente. Quando o padre pegou a hóstia para ma entregar minha mãe por traz de mim que estava, cantando mesmo acenou com a mão negativando minha resposta e o padre passou minha primeira hóstia para o próxima fiel. Eu, inocente, só mais tarde fiquei sabendo que só depois da primeira comunhão.

Bem, o tempo passou e tem mania de passar rápido mesmo, já estou com 48 em 3 de set próximo se a pandemia não me levar, e nunca mais estendi às mão para receber a hóstia. Verdade é que trilhei por outras crenças e pertenço a outro tipo de credo, mas considero a todos filhos do mesmo pai no campo espiritual.

Apesar da vergonha que passei, mamãe nunca me censurou por isso. Também pondera. Pecar por ignorância não é tão pecado assim.

CARLOS JAIME
Enviado por CARLOS JAIME em 21/08/2020
Código do texto: T7042468
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