Maria Frô

Maria Flor acordou disposta, apesar de ter se deitado tarde da noite por conta da comemoração de seu aniversário de dezoito anos. Jogou pro lado a colcha de fuxico, que se cobrira durante a noite, ao sentir um friozinho que entrava pela fresta da janela. Lavou o rosto, escovou os dentes com o dentifrisso de menta, sorriu para o espelho. Vestiu-se com o vestido de algodão estampado e calçou as sandálias rasteiras.

Foi para a cozinha, sentou-se a mesa do café. A mãe já estava na lida do fogão de lenha.

– Bença mãe!

– Dêsabençôi fia!

– Drumiu bem?

– Mais ou menos. Tô com uma dor nos quartos.

– Então decha que eu mexo o tacho pra sinhora, mãe.

– Num precisa fia. Senta e toma seu cafezim.

O pai entra com os feixes de lenha colocando a um canto da cozinha.

– Bença pai !

– Dêsabençõi, florzinha!

Saboreou o queijo fresco com o café com leite, a broa de fubá e o paozim de queijo.

Ligou o rádio e tocava a moda de viola favorita dela. Continuou a prosa com a mãe.

– Mãe o que vai te prô armoço hoje ?

– Franguim caipira com quiabo.

– Ah mãe, desde sapassado ocê me prometeu um feijão tropero.

– Emess ! Mais oia aqui Maria Frô acabou a farinha de mandioca. Só se ocê for lá na venda do seu Tião comprâ.

– Vô sim mãe.

– Prestenção Maria Frô, não vai ficar prosiando por aí, senão o armoço se atrasa.

– Tá certo mãe. Vou e vorto rapidim.

– Agora cê podii.

– Tô indo.

– Esperaai pega o dinhero.

Maria Flor saiu rápido, não queria desapontar a mãe. Só que era muito conhecida e era quase impossível não ser indagada pelos conhecidos.

A primeira a ver a moça foi dona Rosário, uma senhora conhecida da mãe da moça.

– Djia!

– Djia dona Rosário!

– Proncêvai?

– Tô indo na venda do seu Tião comprá farinha de mandioca.

– Oiprocêve, as tira da minha sandália se sortô.

– Nossinhora. E como a sinhora vorta pra casa?

– Díficii né?

– Intão pega a minha emprestada.

– Não Frô e ocê?

– Num vai fazê farta, moro pertim.

– Brigada fia, dispôs eu intrego.

Maria flor sai correndo para compensar a parada. Mas a mãe há de entender que ela queria ser prestativa com dona Rosário.

Mas não demorou muito para Maria Flor encontrar outra conhecida. Dessa vez foi Carola que a chamou.

– Maria Frô, que bom te encontrar. Queria uma informação. Onde eu comprô linha de crochê pra minha vozinha.

– No armarinho da dona Esmerarda, uai.

– È longe?

– Que nada, é logali!

– Onde?

– Ocê pode ataiá pelo meidapráss! Aí ocê sobe a ladeira. Dá uns cinco quarteirões até a igreja. Dispôs ocê vira a direita até uma esquina que tem uns pé de manga. Aí ocê sobe mais uns treis quarteirões numa nova ladeira, e quando chegar na esquina de um predinho amarelo você vira a esquerda, aí ocê avista uma casa amarela de janelas azul. É lá!

– Brigada Frô !

– Manda um abraço pra dona Esmerarda, diz que qualquer dia vou lá.

– Mando sim, tchau Frô.

Maria flor torce para não encontrar mais ninguém no caminho. Mas não tem jeito. Dona Dinorah acena pra ela, vindo em sua direção.

– Djia Frô

– Djia dona Dinorah.

– Foi bom ti encontrá. Tô vendendo uma rifa, e só farta uma. Você podia….

– Craro, eu fico com ela.

– Quanquié?

– Cinco conto.

– Tenho que ir agora a mãe me ispera.

– Agradicida.

Maria Flor resolve ir de cabeça baixa, assim talvez consiga chegar a venda mais rápido.

– ôoo Maria Frô, não tá me vendo?

Era o Tonico, um paquera. Mas agora não podia ficar mais de prosa. Acenou e disse estar atrasada. Mas o rapaz insistiu.

– Maria Frô eu preciso fala côce.

Sem saída, ela parou e ouviu o moço.

– Vou esperar ocê na quermesse no sábado.

– Tá bão, eu vou tá lá.

– E oia, eu colhi essa frô procê. Uma frô pra uma frô.

– Brigada Tonico. Ocê é muito gentil.

– Inté!

– Inté!

Finalmente Maria Flor chega a venda do seu Tião, e antes que seja atendida por ele, ela dá com os olhos com o cartaz. Fiado só amanhã!

Então se lembra de que, com o dinheiro, comprou a rifa. E quando seu Tião a atende :

– E o que a moça vai levar hoje?

– Nada não seu Tião, eu só queria saber se a mãe esqueceu a sombrinha dela aqui isturdia?

– Não, não deixou.

– Brigada seu Tião, inté!

Maria Flor não quis pedir fiado, o cartaz era bem claro.

Chegou em casa rápido, na volta não encontrou nenhum conhecido. Entrou pela porta da cozinha e a mãe foi logo perguntando:.

– Cadê a farinha?

– Eu mudei de ideia mãe, no caminho me deu uma vontade de armoçar frango com quiabo.

– Sem mais nem menos?

– Foi.

– E aproveitando que eu não comprei a farinha, comprei uma rifa da dona Esmerarda.

– Sei !

Depois de tanta correria, Maria Flor foi para o quarto descansar enquanto esperava o almoço. Mal sabia ela que a Carola estava descansando no meio do caminho da subida íngrime da primeira ladeira.