Amigos
Era um homem sábio. Muitos o procuravam para se aconselharem. Levava uma vida simples. A casinha de sapê, colchão e travesseiro de paina. Ao lado da cama um caixote onde colocava a moringa de barro. E de baixo da cama o urinol. As roupas ficavam num pequeno cesto que fora tecido por ele com fibra natural. As roupas eram muito bem lavadas no ribeirão perto de casa. O sabão era de cinzas feito por ele mesmo.
Quem o visse a distância poderia pensar ser um homem triste, sozinho. Mas estariam enganados. Seu Quinca era a pessoa mais popular do povoado. Sabia contar causos como ninguém. Se a diversão era a pescaria, lá estava ele para animar o pessoal.
Se alguém adoecesse ele estava pronto a fazer companhia, um chá ou uma oração.
Tinha algumas vaquinhas leiteiras. Madrugava para tirar o leite e depois faria o queijo que era vendido ou trocado por outra mercadoria na venda do seu Maneco. Os dois eram amigos desde a infância.
Seu Maneco era um homem falante. Ao contrário de seu Quinca, morava com uma família grande. Esposa, cinco filhos, todos já adultos, um primo agregado e duas parentas que vieram de outras paragens. A venda ficava em frente a casa. Era muito sortida. Logo na frente ficavam os sacos de cereais, arroz, feijão, milho que eram vendidos a granel. Mais atrás os sacos de farináceos. E havia uma farinha de mandioca muito apreciada por seu Quinca. Era torrada nos fundos da casa de seu Maneco pela esposa, as parentas e duas filhas. Era uma farinha bem fininha, deliciosa para tomar com leite, ou misturada a rapadura. Da farofa nem se fala, de carne seca desfiada era uma refeição e tanto.
O queijo de seu Quinca era da melhor qualidade e se juntasse ao polvilho feito por dona Maroca, a esposa de seu Maneco, dava o melhor pão de queijo da região.
Os ovos caipiras de gema bem amarela quase laranja eram empilhados sobre o balcão. E as vassouras de palha ficavam suspensas sobre as cabeças, amarradas nos caibros da venda.
Mas o que chamava atenção era o baleiro bem grande que girava quando o dono procurava a bala que o freguês queria.
O balcão com vitrine deixava os olhos grudados nos doces caseiros. Havia pé de moleque inteiro ou moído, doce de abóbora, bananada, goiabada, doce de leite na casquinha, suspiro e muitas outras guloseimas.
Hoje é dia de seu Quinca levar os queijos para seu Maneco. Mal sabe ele que uma surpresa o espera. O amigo da venda lembra do seu aniversário de oitenta anos. E não poderia deixar passar em branco.
Quando entra na venda não vê ninguém. Olha para um lado, para outro, espia para dentro da porta que dá para a casa. Retira o chapéu, coça a cabeça e o coloca de novo. Então bate palmas e diz: – ôoh de casa! E para surpresa vem toda a família de seu Maneco cantando parabéns pra você. E a dona da casa levando um bolo confeitado e recheio de ameixa, o preferido do aniversariante.
Essa foi a melhor surpresa em oitenta anos para seu Quinca.