Talvez viver seja isso...
Numa tarde de domingo, o sol brilhava, ventava suave, as árvores exalavam o perfume das flores na primavera, uma delícia.
Mia, uma moça no auge da sua mocidade, pensou entusiasmada: “Que dia perfeito para passear pela cidade, conhecer pessoas, tomar um café com bolo milho quentinho, ou quem sabe um sorvete de doce de leite.”
Nesse meio tempo, imaginou quem cruzaria seu caminho, se algum homem bonito, ou talvez uma mulher fabulosa, cumprimentando-a com a cabeça, ou até dando um sorriso tímido. Não importava pra quem fosse ou o que encontrasse pelo caminho, a surpresa pode ser boa, ou não, só vivendo se sabe. Pra uns, isso pode parecer loucura, e se for, qual o problema?
Mia resolveu sair de casa, do seu lugar, do seu bairro pacato, mover-se para onde o seu desejo a levasse. Muito embora, isso, não fosse tão simples pra ela, ao mesmo tempo que desejava o novo, o novo também a assustava. O medo era evidente, o seu desejo latente. Medo e desejo andam juntos, caso você não saiba.
De um pulo só, correu pela casa, tomou um banho demorado, se perfumou, colocou um vestido rodado cheio de cor e vida, assim como ela se sentia, viva!
Viva, viva por dentro, sentia que precisava sair, ver gente, trocar palavras com estranhos, sentir o cheiro do mundo, ouvir a risada de crianças brincando, sentir o vibrar dos carros no asfalto, necessitava ver a vida sendo vivida de outro lugar.
Sem pressa, saiu de casa, atravessou a rua, subiu no ônibus que parecia estar a sua espera, embora não estivesse. Por incrível que pareça, o seu lugar na janela estava desocupado e pôde apreciar a paisagem pensando nas inúmeras coisas que gostaria de fazer durante sua existência.
Enquanto o vento batia nos seus cabelos, sorria pro céu, mesmo que seu coração palpitasse tão forte a ponto de sair pela boca.
Finalmente, depois de vários minutos atravessando a cidade, chegou ao seu destino, leve e sorridente, com um frio na barriga por ter sustentado o desejo de sair, de viver apesar de.
Tomou seu café com bolo de milho quentinho, apreciou as pessoas que entravam e saiam do estabelecimento, algumas acompanhadas, outras sozinhas ou em bando. Ficou imaginando, naquela tarde gostosa de domingo em repetir outras vezes esse passeio, fazer outros que estavam no papel a muito tempo, sentir as coisas simples da vida. Talvez viver fosse isso. Talvez viver, na melhor das hipóteses, era ter medo e enfrentá-los a fim de realizar um desejo. E não um desejo qualquer, não um desejo de um objeto que pudesse satisfazê-la, como ir tomar um café do outro lado da cidade. Não, não é disso que se trata. É sobretudo, de se haver com seu desejo, de se movimentar apesar do medo, de atravessar a vida da maneira que for possível.
Talvez viver seja isso. Talvez viver seja tudo o que Mia ainda não viveu.