Dona Carminha costureira...
Dona Carminha, costureira...
Todos os dias, ao romper da aurora, se levantava, fazia o sinal da cruz e ia abrir as portas da casa.
Botava as cachorras para dentro, ligava o radinho e, escutando repentistas, passava o café, fazia tapiocas, assava queijo.
Esperava o filho vir tomar café, para se alimentarem juntos...
Depois, postava-se em sua máquina de costura. A achava tão alinhada e sempre dizia para as clientes:
- É elétrica, muito boa, foi meu filho que me deu, ele trabalha na fábrica!
Revezava-se entre a máquina e os afazeres domésticos... Preparar almoço, botar comida pros bichos, receber alguma cliente.
- A senhora passa o dia sozinha, Dona Carminha?
- É o jeito, né minha filha... Zezinho trabalha na fábrica, é muito longe, vai e volta de trem, os outros filhos casaram, foram embora. Disseram que aqui não tinha meio de vida.
- E tem?
- Tem mesmo não. Só comércio e serviço público. Faz dois anos que Aninha foi pra São Paulo, disse que começou a trabalhar logo, alugou um quitinete, tà bem!
- Se estivesse aqui...
- Aqui ela passou muito tempo parada. Là, pelo menos, tà trabalhando.
Eu sei que se Zezinho sair dessa fábrica, também vai pra là.
- E a senhora, vai ficar sozinha?
- Com Deus, minha filha, com Deus. Eu jà passo o dia bem dizer só, se não fossem minhas clientes de costura. Não vou deixar o que é meu não.
- Não tem medo?
- Não, nasci, me criei e vivi aqui nesse pedaço minha vida toda. Quero ficar até o fim.
Pode provar seu vestido, veja se està do seu gosto!
- Ah, mas ficou muito bom, acho que vou comprar tecido pra senhora fazer outro.
- Do mesmo modelo?
- É, mas com outro tecido, porque esse modelo me vestiu muito bem.
- Carece ser do mesmo pra vestir bem não, pode trazer que eu faço de outro e você vai gostar, fique certa disso!
- Ai Dona Carminha, como é bom quando a gente pode contar com os serviços de um profissional capacitado e que se garante no que faz!
- Mas era pra todo mundo ser bom no que faz, não era?
- Era, mas muita gente, além de só visar o lucro, não està se incomodando com a satisfação do cliente. Por isso que eu venho de Natal fazer minhas roupas com a senhora.
- Muito grata, minha filha.
- E olhe, se Zezinho chegar a ir mesmo para São Paulo, pense em ir com ele, uma costureira como a senhora não passa aperto de jeito nenhum.
- Vou não, minha filha, tem jeito não, cinco jà foram, uns três me chamaram, mas eu não quero ir não, sou feliz aqui no Brejo...
Thomas Saldanha, Natal, 16/06/2020