A dor de uma mãe que perde o filho

Seu peito parecia querer paredes para se expandir, pois a dor era tamanha que o peito não a comportava.

De longe, ouviu-se o seu grito:

--Aaai! Meu Deus, o que foi que eu fiz!

O grito de dor rompeu o barulho da noite, naquela madrugada fria. Seu grito foi como daqueles sons que faz as aves levantarem voo. A navalha da dor cortava-lhe a alma. E a noite fez silêncio, o vento cessou o sibilo, a lua cheia escondeu o seu brilho e um peso que não se calcula pairou no ar.

A notícia veio a galope, mas ao bater à porta, empacou. Não sabia mais como andar. Ela olhou para os portadores da notícia. Naquele momento, ela viu que ele faziam jus ao que eram chamados: porta-dores. Mas seus olhos já comunicavam o estranho.

Virou-se rapidamente e foi à cozinha e disse-lhes:

-- Esperem um pouco, deixe-me beber um pouco de água, pois a minha alma já sente que o meu coração vai secar.

Eles, os portadores se entreolharam compreensivos e aliviados pelos segundos que lhes poupavam da enfadonha notícia.

Ela voltou e com lágrimas nos olhos disse-lhes:

--Podem falar, o que aconteceu?

Com muito jeito, um deles se aproximou e completou o que os olhos já haviam começado a falar:

-- Seu filho... ele...sinto muito...

-- Nããão! -- gritou ela--Não complete essa frase, você não tem esse direito.

Ela já tinha entendido o que aconteceu e naquele momento seu coração e sua razão entraram numa briga ferrenha.

--Onde ele está?-- disse ela empurrando o rapaz e correndo para a porta. O rapaz inerte no meio da sala, olhava para ela, sentindo-se um pouco culpado pela dor que se estampava no seu rosto.

Enquanto isso, o outro rapaz que o acompanhava seguiu-a rapidamente,

agarrou-a e abraçou-a, ao mesmo tempo em que ela o esmurrava, então ele completou a frase do outro:

-- ...ele se foi Dona Rita, ele se foi...

--Você é mentiroso! Que brincadeira de mau gosto! Onde está ele?

O primeiro rapaz respondeu:

-- Ele sofreu um acidente. Pessoas estavam fazendo racha com carros na avenida principal e ele foi atingido por um deles em alta velocidade.

De repente, silêncio total na sala.

Minutos depois, aquela mãe recobrava os sentidos, e percebia que tudo era real, não era um pesadelo.

Sob efeitos de calmantes, ela assistiu ao velório do seu filho que havia saído para comprar um presente para a irmã que faria aniversário naquele fim de semana. O presente foi entregue por outra pessoa.

Dona Rita, sentada naquela cadeira e amparada pelos amigos e familiares, via cada um chegar em silêncio contemplar o garoto no caixão, alguns entalados, nada saía de suas bocas, um visível nó na garganta juntamente com a respiração pesada era tudo que dava para notar. outros com lágrimas nos olhos, outros desesperadamente aflitos, com bolsas lacrimais inesgotáveis. De onde conseguiam tirar tantas lágrimas? Provavelmente, de dentro da alma. Algumas pessoas se dirigiam à Dona Rita e apenas seus olhos conversavam, numa profundidade difícil de se calcular. Outras diziam:

--A vida é assim mesmo.

Dona Rita, em um repente, levantou-se, e expôs:

--Que direi eu neste dia? O véu do meu coração se rasgou e senti coisas que nunca senti,esse compartimento do meu coração eu não conhecia, O compartimento da dor que converte em lágrimas como agora vocês podem ver. Juntem meus amigos, juntem os cacos do meu coração. Juntem e com o carinho de vocês colem os noventa e nove pedacinhos.

Eu agradeço. Mas ele nunca estará completo, pois uma das partes mais importantes agora jaz, longe de mim.Ah! Se eu pudesse me juntaria a ele e seríamos um todo outra vez, mas sou impotente para fazer tal coisa.

E prosseguiu a falar, virando-se para o filho, que parecia dormir entre as flores que enfeitavam o seu corpo, retendo o olhar e a emoção de todos

os presentes:

--Ah! Meu filho querido dizem que a dor de parto é a dor mais forte que uma mulher costuma sentir. Mas hoje descubro que nenhuma dor é mais forte do que a dor de te ver partir.

Todos ali tomados de emoção e dor, sentiam-se meio perdidos diante de tudo o que viam, ouviam, se tornavam participantes. E muitos puderam sentir que a noite de qualquer mãe que perde um filho a quem ama, pode ser a qualquer hora até mesmo ao meio-dia, quando tudo escurece e se converte em agonia.

O tempo passou e Dona Rita foi juntando os pedacinhos do seu coração, mas sempre sentia a falta daquele pedacinho que tornava o seu coração completo. Até que um dia, por causas naturais, el descansou de toda a dor que disfarçava sentir e foi juntar-se àquele pedacinho que tão cedo lhe fora tirado do coração.

Dona Rita, partiu também, e partiu andando pelo Caminho que ela sempre acreditava. O Caminho que dava a ela a certeza de que seu filho estava bem e que fazia dessa certeza o unguento mais perfeito de todos, a fé de um reencontro. Dona Rita descansou feliz porque em seu coração ela acreditava ter encontrado o Caminho, a Verdade e a Vida, ela tinha encontrado Jesus e em Jesus estava também o seu filho. Assim os dois mãe e filho voltaram a andar juntos.