O carro do seu Tião
A casa ficava numa ruazinha de pedra pé de moleque. A varanda contornava a casa de telhado quatro águas. Havia uma grande quantidade de plantas penduradas nas vigas de madeira. Além de armações de ferro onde se sustentava lindas samambaias de diferentes espécies, como renda portuguesa, de metro, americana, havaiana e muitas outras. Sobre uma parte da mureta ficavam as avencas, o xodó da dona da casa, dona Altina. Ela tinha o cuidado de deixá-las num lugar fresco e ventilado, mas que tivesse claridade. O marido, seu Tião, era caprichoso, até demais, ele gostava da casa sempre bem pintada. Do lado de fora era uma pintura sempre de cor alegre, um ano amarelo, outro ano laranja e assim a cada ano ia mudando. Se a casa era amarela as janelas eram pintadas de azul e houve até um ano que foram pintadas de amarelo e verde respectivamente. A casa passou a ser ponte de refêrencia na cidadezinha, quando alguém queria ir lá para os lados da casa de seu Tião e de dona Altina, as pessoas diziam, fica lá para as bandas da casa colorida.
Do lado de dentro da casa não era diferente, as cores também predominavam. Na sala as paredes eram brancas, mas os móveis e os acessórios eram bem coloridos. Na sala de jantar, a mesa de madeira fora pintada de amarela e as cadeiras de branco,mas o sofá da sala de visitas era neutro e as almofadas eram coloridas, bem extravagantes, cores vivas como vermelho, laranja, amarelo. A cadeira de balanço a um canto tinha um encosto acolchoado estampado. E nas paredes haviam quadros de casarios coloridos. A cozinha e os quartos também tinham seus encantos. Na cozinha a mesa já era de madeira natural, mas a cor ficava por conta do fogão de lenha muito bem encerado com cera vermelha, dona Altina se orgulhava de deixá-lo vermelhinho como uma goiabada. O piso era antigo, mas muito bonito, um ladrilho hidráulico com fundo branco e flores azuis.
O colorido dos quartos ficava por conta da colchas de fuxico feitas pela dona da casa. O tecido de algodão estampado era cortado em círculos, alinhavado e fechado em rodinhas que eram emendadas e transformadas em lindas colchas. Eram tão lindas que dona Altina virou fuxiqueira, fazia dessas colchas para vender.
Mas o grande destaque da família era o carro. Seu Tião comprara do compadre, e tinha grande apego ao automóvel, só que com os anos apesar do cuidado do dono ele foi ficando bem velhinho e num dos passeios o capô foi perdido ao ser emprestado a um amigo. Quando saiam ele e dona Altina levavam a sombrinha porquê chovia dentro do carro. E dependendo do tempo do passeio, dona Altina tinha que colocar os pés sobre o banco porquê o assoalho do carro esquentava muito. Seu Tião ia dirigindo e dona Altina dizendo que deviam comprar um outro carro. Os filhos que já eram adultos nunca pediam o carro emprestado, preferiam ir a pé. E quando ele oferecia carona para algum conhecido era logo dispensado com cortesia. Até que chegou um dia que ele resolveu vendê-lo, mas não apareceu nenhum comprador. Foi quando seu Tião teve a idéia de rifá-lo e por amizade alguns amigos compraram a tal rifa. Mas o quê ele não esperava é que o sortudo se recusasse a receber o carro.