Isolamento social

Apanhou o celular, que estava tocando na mesinha ao lado do sofá. Era Vanda.

- Interrompo? - Indagou ela, parecendo relaxada, quase brincalhona.

- Se interrompeu, ainda tenho o resto do dia para terminar minha lista de tarefas - replicou, sentando-se no sofá.

- Sério, o que você estava fazendo?

- Pus a roupa de cama na máquina de lavar. E ia me sentar para ver as últimas notícias, que é mais ou menos o que estou fazendo o dia inteiro há uma semana.

- Sei... estou mais ou menos na mesma situação. Mas ainda tenho os gatos para brincar... e você?

- Nem um cacto para pôr água. Você sabe que não posso me dar ao luxo de ter algo vivo dentro de casa para cuidar... além de mim mesmo, claro.

- Quem manda viajar o tempo todo? E agora, está preso em casa, vendo o mundo pela janela - provocou Vanda.

- Não há muito o que ver, o movimento caiu na rua - admitiu ele. - Por isso, deixo a TV ligada. Eu nunca tinha percebido como 24 h demoram tanto a passar...

- E amanhã, mais 24 h - lembrou Vanda. - E depois, mais 24 h.

- Prisão domiciliar - retrucou ele.

- Isolamento social, é o termo correto - corrigiu Vanda. - E, ao menos, você tem um apartamento relativamente grande para cumprir a pena. Dá pra fazer jogging no corredor do prédio?

- Se não houvesse uma câmera de segurança, acho que eu faria mesmo - ponderou. - Mas, não dá... não quero que o porteiro pense que eu enlouqueci preso em casa.

- Hoje eu me abracei - confessou Vanda de súbito. - Estou sentindo falta de contato humano...

- Ainda não cheguei nesse estágio - riu ele. - Mas se ficar mais uma semana em casa, quem sabe.

- Quando vamos nos ver, tomar uma cerveja e esquecer das preocupações? - Indagou ela.

- Assim que essa confusão passar - suspirou ele. - Por enquanto, "ver" só se for por videoconferência...

- [20-03-2020]