Aos 40
Aos 40
Tô batendo na casa dos 40. Quatro ponto zero. A idade da loba. Nunca entendi isso de loba. Por quê? Vou sair por aí uivando por acaso? Nada que São Google não interceda por nós... “essa expressão surgiu nos anos 1980 com a publicação da obra “Quarenta: A Idade da Loba”, de Regina Lemos, na época proprietária da revista Marie Claire. Sendo uma das pioneiras da revolução sexual, Regina resolveu publicar um livro sobre a situação das mulheres que, como ela, viveram as turbulências dos anos 1960. No livro, revelavam como estavam encarando as transformações físicas e emocionais da meia-idade. Regina se referia a essas mulheres como “lobas” em alusão aos tempos em que elas se rebelaram contra a condição de donzelas ou chapeuzinho vermelho, para se equipararem aos homens na figura do lobo mau.” Entendido, prossigamos. Dizem que a vida começa aos 40, e me pergunto quantos anos tinha quem disse isso, oitenta? Cem? Se realmente começa aos quarenta, no meu bolo de aniversário vou colocar uma velinha com o número zero. Até que é simpático.
Digo que “estou batendo na casa dos 40” porque venho fazendo quarenta anos desde o ano passado, quando fiz 39. Desde aquele dia a sombra enrugada dos 40 já me espreitava com olhar sarcástico, como quem diz: “vem pros bracinhos da tia enta...vem... daqui ninguém sai vivo, HAHAHAHA”. Mentira, tem quem saia sim, o avô do meu marido morreu com cento e dois, HAHAHAHA. Tudo bem, é um caso raro, mas eu tô me cuidando. Lá pelos trinta comecei a perceber que não dava mais pra mandar pra dentro tudo que tivesse vontade, como havia feito até então. Cortei um docinho aqui, um pãozinho ali, uma pizza acolá, e boa. Na casa dos trinta e cinco, porém, percebi que teria que mudar um pouco mais pois a casa estava, digamos, com algumas rachaduras, a pintura meio desgastada. Resolvi então começar a investir em cremes. Caramba, não tinha noção do tempo (e dinheiro) que eles tomam de uma mulher...: lava com gel facial (no meu caso, pele mista a oleosa), seca com toalha de papel (pra não contaminar), passa tônico (pra pele mista a oleosa), passa o creme pra a área dos olhos (com o dedo mindinho), passa o filtro solar (com os outros dedos pra não misturar com o dos olhos), PRONTO, agora pode começar a maquiagem! E isso foi só a cara... fora o resto. Pelamordedeus! O pior é que antes não fazia nada disso e tinha a cara lisinha, agora, passo por todo esse ritual e o bigode chinês e as aspas estão lá, cada dia mais estabelecidos, como um sem-terra abanando o termo de desapropriação. E a casa continuou desabando... aos 37, depois de perceber que de nada adiantou trocar o açúcar pelo adoçante e a farinha branca (apedrejada, amaldiçoada, culpada por toda curva adiposa da humanidade e jogada no calabouço da pirâmide alimentar) pela farinha integral (ícone da revolução nutricional do século 21, junto da granola, linhaça, chá verde, branco, vermelho, tricolor, alvinegro), a balança impávida insistia em marcar 5 kg a mais do que há 5 anos. Bem, cinco kilos em cinco anos, façamos as contas, se conseguir sair dos “enta” provavelmente não será possível entrar no caixão, a menos que seja um container... é... não dá... Assim, atendendo aos apelos publicitários de 11 entre 10 revistas boa forma, dieta já, magra e feliz e outras do gênero, resolvi testar a célebre e nada criativa frase “torre 5 kg em um mês, CORRENDO”. Vamos lá, né, não custa tentar. Me inscrevi numa assessoria esportiva (custa tentar), afinal, quero ter certeza de que não vou infartar correndo. Aliás, se tiver que infartar, que seja socada dentro de um bolão floresta negra ou numa pizza gigante 7 queijos... bom ... tá, passados 2 longos anos, estou eu pronta a participar das corridas de rua de 10 km! Justo eu, que não acreditava que seria capaz de dar uma volta inteira no Barigui! Quem diria, desde a maratona de Curitiba/2008 tenho orgulhosamente concluído 10 kazão!!! Que luxo, que orgulho, que disciplina! Levanto no domingo cedinho e lá vou eu correr os 10 kazão! Quantos kilos perdi??? Errr... bem... nenhum... afinal, quanto mais vc manda pra fora, mais vc manda pra dentro... bom... mas pelo menos não engordei. Então tá... daí descobri que não basta correr, tem que fortalecer: e dê-lhe pilates (outro companheiro da farinha integral, linhaça e.... você já sabe...).
É, pra quem não esquentava com nada disso até os trinta, que revolução! Tô me achando A ATLETA. Tudo isso pra amenizar o peso da idade. E agora faço quarenta, não adianta a linhaça, o chá branco, o pilates, o creme da Lancôme, a máscara de argila branca, FAÇO 40. Coincidentemente, nesse mesmo ano, meu pai faz 60. Juntos, fazemos 100. São idades emblemáticas, que fazem pensar. Faço 40 mas não me sinto com 40, em alguns aspectos me sinto com 80, em outros com 20. É estranho... não me sinto encaixada no protótipo de uma pessoa de 40. Não me sinto uma “senhora”, e, quando assim me chamam, é quase uma ofensa. Não que ache ofensivo ser uma senhora, mas simplesmente ainda não me sinto uma e acho que vai demorar. Sempre que tô com saco, eu corrijo: “não me chame de senhora, não gosto”, e aí, me sinto meio senhorinha sim, daquelas ranzinzas. Quando me chamam assim, tenho a impressão de que tem alguma vovozinha tricotando atrás de mim. Que desaforo! Eu sei, não passa de um número, mas parece uma data marcada pra balanço, pra ver até onde você chegou e aonde quer ir daqui pra frente. Li uma frase ótima outro dia, acho que era do Woody Allen, dizia assim: “a gente tem a cabeça redonda que é pros pensamentos poderem mudar de direção”. Não é verdade isso? A gente muda tanto, graças a Deus. Tenho medo do definitivo. Por isso nunca fiz tatuagem, nem filho. Mudamos muito, e a gente só sabe disso bem depois, olhando pra trás com o distanciamento do tempo. Nossa, já estou falando como coroa mesmo... Bom, não sei se sou melhor ou pior hoje do que há vinte anos ou daqui a vinte anos; nem tenho certeza absoluta de nada agora. Só sei que é estranho fazer 40.