Conto das terças-feiras – Momento literário
Gilberto Carvalho Pereira – Fortaleza, CE, 10 de março de 2020
Há dois anos fui convidado para conversar com alunos de um colégio de Fortaleza, que promovia a semana da escrita. Os alunos foram instados a escrever um texto, de livre escolha, para fazer parte de um livro, a ser lançado no dia do escritor. Foi um bate papo muito agradável e cheio de surpresas. Muitos desses alunos estavam bastante entusiasmados, digo até, empolgados por demais da conta.
Falei sobre a minha experiência de escrever. Falei-lhes que eu era aficionado por contos, principalmente os contos curtos, para não me emaranhar entre as inúmeras páginas de um texto maior, não fazer troca de personagens e perder o fio da meada. Foi assim que comecei a escrever contos, a partir de minhas histórias, guardadas na memória. Disse-lhes que no início eu gastava muitas folhas, rasgando-as, eram escritas em máquina de escrever. Não pensava em publicar textos, ou contos, somente como exercício de fixação do que guardava dentro de minhas lembranças, em folhas de papel em branco. Diferentemente de outras pessoas que escreveram ou escrevem ainda, não é um dom que herdei de meus pais. Como estudante, li alguns livros – por obrigação do currículo escolar – de escritores famosos, mas sem entusiasmo nenhum.
A partir desse momento percebi que os alunos começavam a ficar inquietos, angustiados para fazerem suas perguntas, tirarem suas dúvidas. Deixei-os à vontade:
— Qual a melhor idade para começar a escrever? Perguntou o aluno mais inquieto. Em resposta listei alguns escritores e poetas famosos e suas idades quando produziram seus primeiros textos. Por exemplo: Nélida Piñon, 13 anos; Dias Gomes, 15 anos; Jorge Amado, 14 anos; Ignácio de Loiola, 13 anos; Clarice Lispector, 22 anos; João Cabral de Melo Neto, 20 anos; Graciliano Ramos, 12 anos; Guimarães Rosa, 23 anos; Luís Fernando Verissimo, 37 anos; Ana Maria Machado, 36 anos; Cecília Meireles, 18 anos; Machado de Assis, 16 anos.
— Portanto, não há idade determinada para escrever um conto, texto ou poema. Geralmente o mais difícil é publicar. Recomendava Virginia Woolf “ninguém deve publicar antes dos 30 anos, os jovens não têm ainda experiência da vida”. Hoje, isso não mais acontece, os jovens estão bem mais preparados, em todos os sentidos.
— E a sua experiência? Perguntou-me outro aluno.
A resposta foi fácil — Meus primeiros escritos datam de 1970 e a primeira publicação foi em um Jornal da Cidade de Itabuna, um poema dedicado à minha esposa. O primeiro livro de contos foi publicado em 2013.
— O que devemos ler, os clássicos, romances, poesias, contos?
— Vocês estão na faixa de idade entre 13 e 15 anos, se não estou errado. Tirando os clássicos, agora, você deve ler aquilo que lhes agrada. Procurem romances, poesias, contos curtos, nada de coisa difícil, enfadonha, para evitar a desistência já no início da leitura. Não ponha obstáculo ao seu primeiro contato com a arte de escrever. Não diga que não tem tempo, que é péssimo na escrita, só consegue ir até a primeira folha do papel. Negocie o seu tempo, pegue outra folha de papel, converse com ela, vá escrevendo e não se preocupe com os erros, depois você solicita para uma pessoa ler o que escreveu, e se ela achar erros, peça para aponta-los.
— Qual o tema ideal para iniciar um conto? Alguém perguntou lá do fundo.
— É bom iniciar com uma história vivenciada por você, pode até mudar os nomes dos personagens, o local, caso não deseje se fazer presente. Sua vida é cheia de histórias, de sua família também.
— Publicar é difícil? – perguntou alguém.
— Para um desconhecido é sim, mas se o seu texto é bom, seja persistente, você, autor desconhecido, pode ser descoberto. Muitas pessoas estão postando seus trabalhos na internet. Os concursos literários estão aí, informem-se. Ganhar um prêmio e ser publicado, às vezes, representa muito. Fé, força de vontade e talento é preciso. Vocês não devem se preocupar com isso agora, o importante é produzir algo até chegar aos bons textos. Para isso você precisa ser constante, obstinado, disciplinado quanto ao horário escolhido para escrever, sob pena de não terminar o que começou. Ter vontade de ser escritor não basta, é preciso vencer a indolência. Mãos à obra!
Terminamos nosso bate papo, distribuí alguns exemplares dos meus três livros e fui convidado a posar para a foto com os presentes. O semblante dos alunos e os agradecimentos das professoras responsáveis pela edição do livro deles demonstravam que foi proveitoso aquele momento literário, com jovens ansiosos e sedentos de conhecimentos. Saí do auditório satisfeito.