UM AMIGO FIEL

Carlos estava de saída, pegou suas malas, estava acabado após aquela dura separação, não é fácil sofrer traição da pessoa que mais amamos.

Com isso no coração, Carlos que estava de férias resolveu ir passar uns tempos próximo a praia, distante de tudo numa casinha que alugou de um antigo colega. Depois resolveria sua vida, deixou tudo na casa de sua mãe, pegou uma mala com roupas colocou no banco de trás do carro e saiu.

Ligou o som do carro pois precisava relaxar um pouco, o horizonte parecia enegrecido. Quando passava pela estrada federal rumo ao litoral, visualizou um cachorro, ele estava amarrado a um banco, parecia inquieto olhando como quem espera alguém regressar, mas Carlos já sabia, alguém o abandonara ali sabe-se lá porque, mas aquilo não era problema dele...

Seguiu ouvindo seu som preferido, a chuva lá fora desabou, andou mais alguns metros, algo lhe sobrevira ao coração...

O pobre cão estava preso, sem poder pedir socorro morreria alí solapado com um possível alagamento.- pensou. Logo, fez um contorno e voltou ao lugar onde vira o animal. Ao avista-lo o cão começou a abanar o rabo e a proferir um som desconexo, parecia contente apesar de enxarcado. Carlos se aproximou, a chuva forte começava a lhe molhar as calças, o guarda chuva não era suficiente. Estendeu a mão em direção ao cão que o lambeu, pegou a corda mas não havia como desatar o nó, o cão lambia sua mão incansávelmente.

- Calma ai só vim te soltar, não se empolgue garoto!

A ventania arrancou o guarda chuva de suas mãos, ele praguejou:

- Que droga! Maldição!

Carlos continuou com a corda, puxou um canivete e a cortou, o cão pulou sobre ele derrubando-o no chão, estava feliz, Carlos proferiu uma bronca: - Olha só o que me fez! Bem bem, agora pode ir, vamos se manda! Carlos virou as costas, a tempestade forte soprava e parecia-lhe faltar o ar. Correu ao carro e entrou trancando a porta. Na avenida muitos carros passavam em alta velocidade desprezando o perigo, Carlos estava ensopado e pegou uma toalha na sua mala, ouviu um barulho, era o cão a fustigar seu vidro, uma enorme boca que latia. - Ora essas, veja o que arrumei pra cabeça! Ele deve estar com fome... Remexeu na sua maleta e encontrou um lanche, dividiu-o dizendo: - É tudo que tenho, tome a metade do meu lanche! baixou o vidro, o cão engoliu sua metade do lanche numa só bocada.

-Meu Deus! - disse ele baixando o vidro- Eu nunca ví nada como isso antes, bem agora vou embora! Adeus! Carlos ligou o carro e saiu, mas o transito parecia estar parando; o cão o seguia pelo acostamento solapado pela chuva densa, queria agradecer-lhe.

- Não garoto, vá embora! gritou Carlos -Vá embora!

O cachorro caiu ao que parecia numa poça d´água, o transito começa a fluir melhor, Carlos olhou no retrovisor, o cão não estava mais lá.

Resolveu ir para o acostamento, o cão não aparecia...

-Ah meu Deus eu ainda vou me arrepender por isso! saiu com uma toalha na cabeça e uma lanterna, andou alguns metros e viu o cão caído na vala, sem demora o puxou pela coleira e o enrolou com a toalha que já estava enxarcada. A essa altura sua roupa já estava toda suja, ele levou o cão até seu carro e o colocou atrás, o cão pulou no estofado enchendo tudo de lama.

- Meu Pai do céu vou gastar uma fortuna pra limpar o carro! Que dia horrivel!...

Horas depois, já próximo a cidade, com fome, ele parou numa pizzaria e comprou pizza e refrigerante, o dono da pizzaria pediu-lhe dinheiro em espécie, visto que não parecia ser uma pessoa confiável, a camisa social coberta de lama, o homem pensou: - Deve ser um bebado inveterado!

Tempos depois, distantes dalí, Carlos chegava ao seu destino, uma casa pequena no alto de uma colina, ao redor só haviam arvores.

Logo, abriu o portão e entrou, o cão o seguiu animado, ainda mais com o cheiro da pizza. A casa parecia não receber visitas há anos, tudo estava escuro, a chuva havia parado mas um frio inquietante começava a soprar e ventos balançavam galhos de arvores altas.

Ao abrir a porta acendeu a luz entrou e depositou suas coisas sobre uma mesa, guardou a pizza no forno de um fogão esmaltado, com um olho no cachorro. - Amigão, é o seguinte, eu vou tomar um banho e trocar de roupas e você vai ficar aqui me esperando ok?

O cão lambeu-lhe o rosto, Carlos fez um sinal de asco, mas depois ponderou, riu, deu ao cão agua e duas fatias de pizza.

Ao entrar no banheiro percebeu um celular sobre a caixa de descarga, era velho, mas funcionava e estava ligado. Raciocinou que fosse do dono que viera arrumar a casa antes de sua vinda e entrou no chuveiro.

Entrementes, o cão devorou os dois pedaços de pizza em duas lambidas, bebeu agua e sentou-se ao pé da porta do banheiro. Não demorou muito e ele percebeu uma corrente de ar, a janela dos fundos do corredor estava aberta, ele então, logo num salto saiu por ela.

Instantes depois, Carlos saiu do banheiro e foi em direção ao quarto, eram comados pequenos, procurou o cão mas não o viu.

Após trocar-se, voltou a cozinha e tirou a pizza, estava faminto, ao mordiscar o primeiro pedaço sentiu algo encostar em sua cabeça, alí havia dois homens magros, um dele lhe apontando o revolver na cabeça disse:

- Nem pense em reagir ou lhe mato aqui mesmo! Vamos passe o dinheiro, rápido!

- E-sta bem- gaguejou Carlos- está no bolso de trás vou pegar.

O homem afastou-se um passo e ficou olhando-o enquanto o outro acompanhava. Carlos colocou o dinheiro na mesa, eram 450,00.

- Só isso? gritou o homem com revólver- Vamos, quero mais!

- Colega aqui não tenho mais, pode me revistar!

- Zeca! - disse o outro - Pega logo essa grana e apaga o cara, depois fazemos a limpa!

Zeca que era o homem que empunhava a arma disse:

- Verdade, já vai tarde seu infeliz! Mirou a arma no peito de Carlos que apavorado não sabia o que fazer. A porta estava encostada se abriu subitamente e o cão pulou no braço de zeca, abocanhando-o com sua grande mandíbula, o revólver caiu e disparou um tiro que atingiu o outro homem na perna. Carlos pegou o revólver e amarrou o homem que levara um tiro enquanto o outro tentava sem sucesso se libertar do cachorro que apertava seu braço:

- Ele vai quebrar meu braço, mande-o me soltar!

Carlos apenas o observava com a arma na mão enquanto falava com a polícia.

- Mande-o me soltar! Meu braço esta quebrando!

- Rapaz mesmo que eu soubesse o nome do cachorro não faria isso, você merece...

A polícia não demorou a chegar, o dono da casa apareceu dizendo não conhecer aqueles homens que foram presos em flagrante.

No fim daquela noite, antes de deitar-se enfim, Carlos ofereceu mais pizza ao cão e disse por fim:

- Obrigado meu amigo, quem dera soubesse seu nome, você é um amigo fiel.

O cão pulou no peito de Carlos, que então pôde ver um pingente que estava grudado em sua coleira. " Thor "

- Ah garoto- disse ele- Então você é o Thor, prazer em conhecê-lo!

Thor deu uma lambida em seu rosto e ele lhe deu outro pedaço de pizza.

Dias mais tarde, de volta a sua cidade, Carlos resolveu alugar uma casa, Thor ficou morando com ele. Um dia a tarde, ao voltar do trabalho, Carlos percebeu que Thor não estava bem. Deu-lhe um banho e enquanto passeava a mão pela barriga do animal sentiu uma saliência grande, do tamanho de uma laranja. Sem hesitar levou-o ao veterinário que deu o veredicto: - Seu cachorro tem pouco tempo de vida, receio que não possamos fazer nada por ele, mas pelo menos podemos diminuir sua dor. Vou lhe passar uma receita.

- Doutor, eu quero que o senhor faça o que for possível para salvar a vida dele, Thor salvou minha vida, não vou deixa-lo morrer assim!

- Olha, você disse que o encontrou abandonado na rua não foi? Eu acho que o antigo dono sabia disso e não quis ajudar o nosso menino, não sei se ainda poderei fazer algo, precisamos de exames.

- Pois faça o que for necessário doutor, e obrigado!

Thor ficou internado por três dias quando o veterinário chamou Carlos:

- Poderemos tentar uma cirurgia, mas é arriscada, ele pode morrer na mesa. Ainda que se salve nada garante que consiga tornar a ter uma vida normal.

Thor pareceu reanimar-se com a presença de Carlos que ganhou uma lambida no rosto. Carlos afagou sua cabeça grande e o abraçou dizendo:

- Sei que não pode falar, nem tampouco escolher amigo, espero que tomemos a melhor decisão por você meu honrado amigo.

Carlos fitava seu querido amigo que pareceu entender e lhe estendeu uma das patas, Carlos a pegou e o beijou na cabeça, lágrimas vieram involuntariamente...

No dia seguinte em seu trabalho, Carlos recebeu um telefonema, o veterinário informou que Thor não resistiu a cirurgia. Após pagar pelos serviços prestados pelo veterinário, Carlos levou seu amigo e o enterrou no quintal da casa, deixando sua coleira no topo de uma estaca.

Todo dia a tarde ao voltar pra casa Carlos passa por lá, toca a coleira e relembra os bons momentos com Thor. De fato a vida é feita de bons momentos; mesmo que estes tenham findado, ainda restam as boas lembranças, algo que nada pode levar.

Fim.

Mario B Duran
Enviado por Mario B Duran em 25/01/2020
Reeditado em 25/01/2020
Código do texto: T6850451
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