Brincando de balançar

O homem andava a esmo pela cidade. Buscava um sentido, uma resposta, qualquer coisa que desfizesse o nó daquilo tudo; mas, em vez disso, só encontrou o parquinho. Foi quando se aproximou do balanço, meio que ressabiado.

Uma cadeira era tora. Da outra, sumida, restaram só as correntes. A terceira era inteira, mas não inspirava confiança - talvez reflexo do cheiro de urina e cigarro que vinha da lixeira próxima.

Ainda assim, o homem olhou para um lado, para outro, depois para trás. Nada nem ninguém, como se o mundo todo se escondesse no tédio daquela tarde quente.

- Nessa idade... - repreendeu a voz interior, bem conhecida, treinada e sabedora de todos os deves e não-podes.

Por isso, foi com culpa que o homem se sentou na cadeira do balanço. O metal era quente, e os dedos sentiram a mistura áspera de pó e ferrugem quando seguraram as correntes.

O primeiro impulso foi pesado e feito com as pernas. A partir do quinto, o homem lembrou vagamento de como usar somente o peso do corpo.

As correntes rangeram ritmicamente, e o barulho da ida era um pouco mais agudo que o da volta, que era mais anasalado.

O vento encontrava o rosto do homem a cada movimento, de novo e de novo. Foi aí que a camada de gesso começou a rachar, a se partir, até que se esmigalhou toda; o homem notou que um rosto, aparentemente o seu próprio, surgia dali debaixo e se sorria por inteiro.

Então apareceu essa senhora. Velha e encurvada, olhava o homem com espanto.

O homem a percebe. De imediato, para de se balançar. Refaz todo o gesso, se levanta da cadeira. Com sobriedade, dá palmadinhas para tirar a sujeita das calças. E parte, ensimesmado, rua afora.

- Nessa idade... - balbuciou a senhora enquanto chacoalhava de leve a cabeça.

E ela seguiria o próprio caminho. Mas ela também andava a esmo pela cidade. Ela também tinha um nó (tão antigo) e buscava um sentido, uma resposta, o que fosse. Foi por isso que ela estacou e teve essa ideia. E olhou para um lada, para o outro; nada nem ninguém.

Foi quando se aproximou do balanço, meio que ressabiada.