O herdeiro

Iran herdara com a morte da sua mulher aquela enorme fazenda. Parece que depois disso acentuou ainda mais a sua avareza, que não era pouca.
A vista da paisagem passou a ser aconchegante, graças à construção do lago e da arborização colocada à volta, imposição feita por sua mulher um pouco antes de morrer, e essa vontade custou a Iran uma fortuna que vivia a reclamar tal desperdício. Seu apego ao dinheiro era tanto que certa vez ao ser indagado pelo irmão se poderia pagar o tratamento que seu sobrinho precisava fazer, respondeu:
- Acha mesmo que eu gastaria meu dinheiro com doença, Alfredo?
- Mas o meu filho pode morrer se não for operado urgente.
- É a vida, meu irmão. Não posso fazer nada.
Seu velho e compreensivo amigo Ari, dedicado espírita, que estava presente neste momento chegou a interceder em favor do menino, mas foi em vão.
Quinze dias mais tarde morria o sobrinho desafortunado.
Algum tempo depois da morte do menino, Iran foi visitado pelo amigo Ari, que o repreendeu e alertou:
- Sua atitude com seu irmão não foi digna de um cristão. Arrependa-se enquanto há tempo.
- Do que deveria eu me arrepender?
- O pior cego é aquele que não quer ver, meu irmão.
- Ari, deixe as citações para uma outra ocasião.
- Então vou lhe dar um conselho; Já que você não quer mudar, procure deixar algum dinheiro à mão para um eventual tratamento que possa precisar. Sem ele, você poderá morrer.
- Não estou doente. Por que faria isso?
- E só uma precaução. Pense a respeito.
- Não. De forma alguma farei isso.
Ari, vendo que não conseguiria dissuadir o amigo de sua posição, deu por encerrada a conversa e a visita. O tempo passava e Iran continuava cada vez mais avarento. Praticamente virou uma doença esse seu comportamento.
Sabendo disso, seu amigo Ari mais uma vez voltou a visitá-lo.
- E então meu amigo, como tem passado?
- Mais ou menos. Vez por outra a saúde da umas rateadas.
- Iran, você ainda lembra do que lhe falei?
- Claro, mas não é nada de tão grave, que um bom chazinho de ervas não possa resolver.
- Eu continuo com o mesmo pensamento. Você precisa deixar um dinheiro aqui na fazenda para qualquer emergência.
- Não posso deixar de aplicar meu dinheiro. Além do mais, o meu procurador é o Alfredo, meu irmão. Esqueceu-se? Ele não me deixaria morrer por falta de recurso. Afinal, o dinheiro ainda é meu, ele só o administra para mim.
- Não se esqueça que você se enfiou nesta fazenda, longe de tudo e de todos.
- Não tem problema. Qualquer coisa mando avisar meu irmão.
- Ponha pelo menos um telefone aqui para poder se comunicar rapidamente.
- Ficou maluco? Acha que vou desperdiçar meu dinheiro com essa porcaria? Será mais uma conta para eu pagar.
- Trata-se de uma necessidade.
- Com certeza assim que souberem da existência dele, ligarão para me pedir dinheiro. Não farei isso.
Ari resolveu não falar mais nada. Era perda de tempo, sabia que não mudaria o pensamento do amigo. Devido a sua teimosia, Iran dois anos mais tarde vem a pagar um preço bastante alto. Sofre um AVC ficando totalmente incapacitado e não podendo se mexer e sem meio de se comunicar, dias mais tarde falece por falta do atendimento médico especializado que não pode chamar.
No velório, por curiosidade Ari em conversa com Alfredo, o procurador do falecido, quis saber.
- Por que você não cuidou do seu irmão? Pelo que sei ele tinha recursos para o tratamento.
- Disse-o bem, “ele tinha recursos”. Entretanto, sendo eu o seu único herdeiro, você acha mesmo que eu gastaria meu dinheiro com doença, Ari?
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Fernando Antonio Pereira
Enviado por Fernando Antonio Pereira em 25/11/2019
Reeditado em 25/11/2019
Código do texto: T6803289
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