Cactos de Beltrão
Ao sair da Bahia, morei em Francisco Beltrão – PR entre 2006 e 2007 e sempre me vem à memória a senhora de quem fui vizinho. Minha vizinha não era racista, preconceituosa, fofoqueira, encrenqueira, nada disso. Era apenas uma senhora na 3ª ou 4ª idade que resumia o “bom viver” com a vizinhança (digo: eu e meus dois primos) ao mais rápido e simples “bom dia”. Certa manhã de quinta-feira, como sempre a vi agir todos os dias desde que cheguei àquela rua, ela saiu e pôs a placa enorme pendurada no portão: “vou ali e volto já” (sempre me perguntei por quê, já que, se morava ali há tantos anos como me disse o locador da casa, não era estranha a ninguém). Àquele dia, já pelas 14h, um caminhão de mudança (deduzi pelo logo das laterais e pelo fardamento dos carregadores) chegou e estacionou à frente da casa. Chamou, chamou e ao me virem entrar em casa, perguntaram pelos donos da casa vizinha. Apontei para a placa pendurada e entrei. Às 18:40min mais ou menos, bateram à minha porta, abri: dois policiais e a vizinha com olhos maiores que faróis no nevoeiro. Indagaram, indagaram e caíram na resposta mais simples. Eu disse: eles perguntaram pelos donos da casa e eu respondi com o dedo ao apontar a placa. A vizinha caiu na minha varanda, chorava pelo menos um atlântico por cada olho. Levaram meus cactos, levaram até meus cactos, gritava e se descabelava. Essa foi a primeira vez que escutei mais que “bom dia” saído de sua boca grande e murcha.