Assassino Interrompido
Capitulo 08
Assassino Interrompido
Buck Jones era um herói – tímido no início dos seus filmes, ou películas, ia se transformando ao longo da história. A gente guardava no coração os momentos em que ele até mesmo sofria abusos por parte dos celerados para em seguida vibrar quando ele castigava os bandidos. Bang, bang, bang. No filme Amanhecer na Fronteira – Buck Jones lidera uma caravana de abastecimento para os trabalhadores da via férrea. Velhacos brancos se disfarçam de índios para atacá-los. Que frustrante, que enervante! Que alegria! Buck Jones descobre a trama e castiga os malfeitores. Bang, bang, bang. Zorro, herói mascarado com sua espada justiceira. Tarzan, rei das Selvas. Billy, The Kid. Nosso coração ainda infantil vibrava com os tiros, as armas: Colt, Winchester – as espingardas, os rifles, enfim. Cada família tinha, em casa, armas. Para caçar, defender a casa – mais de animais do que de pessoas propriamente dito, praticar tiro ao alvo. Meu pai sempre teve armas – nunca matou ninguém. Não era este o mover da época. Bandido era bandido, mocinho era mocinho, digo cidadão do bem era cidadão do bem. Hoje em dia, misturou muito.
No Natal, ganhávamos – comprados em Maringá, uma espécie de capital do Norte Novo; cinturões, estrelas de xerife, coldres e revólveres e rifles de brinquedo. Eu tenho uma foto que foi dada pelo meu tio Adolfo Turbay. Nela, eu aponto uma pistola de brinquedo para a máquina fotográfica (câmera) Kodak. Quando eu atirava, saía do cano um grande rolo de papel espiralado. Kkkkkk. Era muito engraçado. Inofensivo.
Desiludi-me das armas, confesso. Sonhava ser um caubói, xerife, ou até mesmo um pistoleiro profissional. Matar muitos índios, muitos bandidos. Salvar o forte Bravo. Resgatar as caravanas das mãos dos meliantes. Porém, desiludi-me das armas e o mundo perdeu um autêntico Wyatt Earp.
Aconteceu assim. Fui com meus pais a um sítio. Do seu Antenor. De início, uma nota triste. O filho dele, já adulto, mas ainda jovem, estava limpando a sua espingarda e sofreu um acidente que terminou por se revelar fatal. O ambiente era pesado naquele momento. Mas criança é criança. Não consegue se fixar muito em assuntos mais sérios. Logo ali em seguida, peguei minha espingardinha de pressão e saí para caçar. Minha primeira espingarda, minha primeira caçada. Meu sonho: imitar os guris que eu via passar na frente da farmácia, carregando uma fieira cheia de passarinhos abatidos, amarrados pelos pés. Hoje tenho vergonha disto, mas era assim que a gente pensava.
Saí sozinho. Seis anos de idade. Uma pombinha aportou na cumeeira do paiol. Mirei cuidadosamente. Ia errar, pensei, coração disparado. Ia errar, tinha certeza, nunca tinha matado nada. Suava. O tiro foi de pouca monta, um estampido baixo, seco, sem força. Mas... acertei. Acertei, A pombinha branca, inocente, desprevenida, caiu. Matei, vibrei. Corri, cheguei perto, ela estava ensanguentada num montinho feito de palha de milho. A euforia virou preocupação, ela estava ferida, mas não morrera. Preparei o segundo tiro. E olhei para ela. Meu sangue gelou. Ela me olhava triste, humilhada, ferida, súplice. O tiro quebrara sua asa. O olhar dela nunca mais haverei de esquecer. Olhava ao redor, procurando uma solução. Escurecera. O sol estava fraco, pálido. Os pássaros emudeceram. Não havia mais alegria, luz, ou paz para mim. Eu era o agente que criara aquela situação. Infelizmente. Desisti de promover aquela morte. Desisti do assassinato à sangue frio. E por extensão, desisti da carreira de bandido, mocinho, xerife, pistoleiro, e assassino de aluguel. Mas, não podia deixá-la ali ferida. Certo que um gato a mataria. Levá-la para os adultos, jamais. Medo e vergonha. Tinha que tomar uma decisão e tomei. À curta distância, muito curta, mirei mais uma vez. Não vou narrar a conclusão que cada leitor pode depreender. Até hoje, carrego comigo o último olhar de minha única vítima fatal. Hoje, admito que nem peixe eu mataria. Uma coisa é ver tiros, e mortes na tela de um cinema. Outra totalmente diferente é ver a morte ali ao vivo, ceifando uma vida abruptamente. Resolvi virar professor quando crescesse.