O SORRISO DE THALITA

“O sorriso de Thalita sempre foi o mais bonito”, pensei… Mesmo com seu andar desengonçado de menina gordinha, nos anos 90. Pelo menos por fora… não pareciam haver grandes problemas de autoestima. A gordura incomodava, mas Thalita parecia notar que – mesmo ali – o seu peso diferenciado era apenas “parte de um todo repleto cheio de variações”, das mais singelas e complexas lacunas ou projetos de sequelas e traumas futuros. Nada com poder de antecipação… Talvez fosse por isso que, além de seus grandes cabelos lisos e muito pretos – e sua situação financeira excelente – que faziam com que as outras meninas da escola, não só a deixassem em paz, como procurassem sua “amizade”, “para sempre e para todo o sempre”, Thalita sempre soube que dentro daquela vida que tinha e escolhera manter… não existia lugar para grandes e verdadeiros… amigos.

… sua ambição era controlada e focada. Sonhava em ser médica, simplesmente por saber que as possibilidades financeiras eram maiores, além da manutenção de seu conforto e sua imagem perante este círculo de amizades e rede sociais, a qual já fazia inteiramente parte. Primeiro por existir, depois pelo seu grande sorriso (o sorriso mais bonito de todos) … e afinal (e somente no final), por sua inteligência. Seu corpo ia mudando… pretendentes e namorados aparecendo, e que iam aumentando e alimentando a sua vaidade e o seu status. Thalita sabia que eram garotos estúpidos. E que não devia esperar muito deles. Seu corpo ia mudando… Ia mudando… Mudando… Até que eu nunca mais a vi.

Na verdade: eu nunca soube porque Thalita mantinha ainda uma certa amizade comigo… Certa vez me disse – com seu sorriso enorme e branco – que eu era seu “único amigo poeta”. Eu dei de ombros sorrindo de volta como quem dizia “e quantos poetas você conhece?”, mas de repente a vida afastou a gente. Nunca mais a vi até hoje mais cedo. Encontrei Thalita no aeroporto e ela tinha o cabelo pintado de loiro. Seu corpo estava muito mais magro. Bonito para muitos. Bonito para – provavelmente – todas as pessoas do meio em que queria viver… Me abraçou com muita força, e pareceu segurar as lágrimas. Depois me deu aquele velho, largo, e inesquecível… sorriso branco.

Me perguntou se eu continuava escrevendo e eu disse que sim. Pegamos o mesmo avião, só que em poltronas diferentes. Pro mesmo lugar só que com destinos e lugares bem diferentes. Lugares muito mais pomposos ela veria, com certeza… Na saída, nos falamos rapidamente, ela tinha pressa… Parecia sentir certa angustia em não poder falar um pouco mais comigo. Aparentemente fazia aquele percurso toda semana. Continuei andando devagar, quase me arrastando pelo aeroporto. Pois, prefiro ser devagar, e prefiro ter tempo. Ter OU NÃO TER, tempo… É uma questão de escolha. E gosto de ir bem devagar. “O sorriso mais bonito…”, Pensei.