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Maria Luíza Marques me disse certa vez, num intervalo das filmagens do conturbado "Paciente Polonês", que decidira ser atriz na infância, assistindo fitas VHS com a avó materna, que era uma mulher culta - e ácida.
- Vovó me dizia que uma atriz poderia viver a vida que quisesse - representando, ou na vida real. E que isso era muito mais do que a maioria das mulheres pensaria em obter. Desde então, comecei a prestar atenção nos filmes que ela via, e a me identificar com algumas das atrizes clássicas de Hollywood.
- Que idade você tinha? - Indaguei.
- Acho que... uns 8, 9 anos.
- E com quais atrizes você se identificava?
- Rita Hayworth... Katharine Hepburn... Bette Davis...
- Bette Davis destoa das outras duas - avaliei.
- Por não ser, digamos, tão bonita? - Replicou Maria Luíza. - Mas todas eram mulheres fortes, tem que reconhecer.
- Não ia nem falar no quesito beleza, mas no tipo de papel que Davis desempenhava. As três fizeram papéis fortes e voluntariosos, mas apenas a Davis especializou-se em interpretar personagens antipáticas, más mesmo.
- Isso deve ter sido efeito da minha avó - reconheceu Maria Luíza. - Ela também dizia que as boas moças eram todas iguais, mas que a vilã era sempre um tipo interessante; que você poderia mostrar muito mais, sendo a malvada, do que a mocinha.
- O que nos traz a este filme - ponderei. - O seu papel é de mocinha, não de vilã.
- É um drama romântico, Renato - ela deu de ombros. - Os desafios aqui são de outra natureza. Mas você questiona a minha capacidade de vivenciar personagens complexas?
- Não questiono nada - asseverei. - Você foi uma escolha praticamente unânime para este papel, e estou muito feliz de que o esteja interpretando.
- Mas você poderia escrever um papel mais desafiador para mim - provocou ela.
- Prometo que o farei - assenti, solenemente. - Algo que esteja verdadeiramente à altura do seu talento.
- Você está fazendo troça - replicou ela, erguendo os sobrolhos.
- De modo algum. Na verdade, baseado no seu perfil de atrizes favoritas, já tenho a ideia precisa de um papel para o qual você seria perfeita. Já pensou em atuar numa série de ficção científica?
- Ficção científica? - Os sobrolhos continuaram erguidos.
- Como protagonista - ressaltei.
- Bem, você pode mandar os roteiros para o meu agente - condescendeu. - Sem dúvida, este é um gênero em que nenhuma das três que citei, jamais ousou aventurar-se.
- Portanto, não poderão lhe fazer sombra - retruquei, piscando o olho.
- [13-08-2019]