Véio caduco divagando

Tinha consciência que vivia num país injusto onde uma minoria vivia à tripa forra e a maioria passava necessidades. Achava que a miséria absoluta estava voltando. Além disso havia um clima perigoso de tensão, onde pregava abertamente a raiva, o rancor e o ódio de classe, A raiva estava dando as cartas e jogando de mão. Lembrava o verso da música de Chico Buarque: "Filha do medo,a raiva é a mãe da covardia". Achava que os pregadores da raiva e do ódio nunca haviam lido as crônicas de Dom Hélder Câmara; e, rnão raro, esses pregadores do ódio eram adentrados nos anos, ignoravam o conselho do Dom do Amor: "Se sentirem que os anos passam, e a mocidade se vai, peçam a Deus, para si e para os que se tornam menos jovens, a graça de envelhecer como os vinhos envelhecem - tornando-se melhores - e, sobretudo, a graça de, envelhecendo, não azedar, não virar vinagre ".

Achava que por mais difícil que fossem as dificuldades era preciso lutar pela democracia e pela justiça social. Sem fazer comoos cristãos da boca pra fora. Esses apenas se fantasiavam de cristãos.

Sempre que estava meio mole e bambo, sobretudo quando lhe batia o sentimento de revolta devido aos atentados contra a democracia e os direitos humanos recordava uma música de Joe arion e Mitch Leight, da peça "O Homem de La Mancha", traduzida por Chico Buarque e Ruy Guerra, "Sonho Impossível" que foi interpretada por Maria Betaânia. No CD, antes de cantar a música ela declamava um texto de Fernando Pessoa: "Tenho uma espécie de dever, de sonhar sempre, pois, nçao sendo mais, mesmo querendo sr mais, que um espectador de mim mesmo, tenho que ter o melhor espetáculo que posso. Assim me construo em sedas, em salas supostas, palco falso, cenario antigo, sonho criado entre jogos de luzes brndas e músicas invisíveis". E depois cantava: "Sonhar mais um sonho impossível/ Lutar/ Quando é fácilceder/ Vencer o inimigo invencível/ Negar/ Quando a regra é vender/ Sofrer/ a tortura implacável/ Rompoer/ A incabível prisão/ Voar/ num limite improvável/ Tocar o inacessível chão/ É minha lei, é minha questão/ Virar esse mundo/ Cravar esse chão/ Não importava saber/ Se é terrível demais/ quantas guerras terei que vencer/ Por um pouco de paz/ Amanhã , se esse chão que eu beijei/for meu leito e perdão/ Vou saber que valeu delirar/ E morrer de paixão/ E o mundo vai ver uma flor/ Brotar do impossível chão".

Adormeceu e sonhou que era o Dom Quixote. Inté.

Dartagnan Ferraz
Enviado por Dartagnan Ferraz em 29/07/2019
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