Crisântemo

Crisântemo

Quando nasceu, seus pais quiseram caprichar no nome; sua mãe viu em algum lugar a palavra "Crisântemo". Não sabia o que era, mas combinava com o nome dos irmãos: A Cristália e a Crisálida, as duas irmãs gêmeas.

O pai achou que "não era nome de homem", mas como vivia ocupado com as idas e vindas do ônibus que conduzia no trajeto bairro-cidade; cidade-bairro, resollveu deixar a mulher decidir o nome do filho, pois quando estava livre, o que era raro, buscava uma branquinha na esquina, pois ninguém é de ferro!

Só depois é que a mãe soube, por alguém ou por um colega que consultou a internet, pois "não sabia mexer naquilo", que era o nome de uma flor; na verdade "flor de ouro", o significado vindo do grego.

Chamaria-se Crisântemo da Silva, algo entre cômico e trágico; as pessoas simples têm pouco com que se dar importância; o nome é uma delas; se era estranho, melhor ainda. O senhor do registro em cartório levantou a sobrancelha ao ouvir o nome, mas registrou assim mesmo: "já tinha visto Rolando Escada Abaixo e Um, dois , três de Oliveira a quatro; Crisântemo não era nada demais."

E assim Crisântemo desabrochou, no terreno fértil dos locais superpovoados , pois não há terrenos mais baratos e nem mais próximos. O pai sempre se recusou a chamá-lo por esse nome; falava simplesmente : "vem cá, moleque" . Na escola que começou a frequentar, no início era a maior caçoada: "Crisântemo? Há,há,há!" Mas como ele era um garoto boa praça, logo começaram a chamá-lo de "Cris"; era mais fácil e os filhos não têm culpa dos nomes que os pais lhes colocam.

Jogava bola nos campinhos, como qualquer garoto da idade e em locais em que ainda existem os raros campos de várzea; era até bom de bola e sonhava com seu nome na amarelinha, com "Cris" encimando a camisa dez. Mas o pé chato e o tamanho mirrado não lhe permitiram passar nas peneiras dos clubes.

Teria um destino semelhante ao do pai, condutor urbano, e o de suas irmãs seria sofrer para lavar e passar roupas dos outros , se um dia o destino não lhe sorrisse; pelo menos pensava assim. Ele e um amigo costumavam gravar esses vídeos esdrúxulos no celular, com as coisas mais estapafúrdias possíveis. A maioria ficava na risada dos colegas que os viam, mas um deles, em que imitava uma siriema andando ao som da música de fundo, rendeu-lhe milhares, até milhões de curtidas.

Para ele foi a glória, embora o mundo só dê importância a esses pobres coitados como uma forma de ironizá-los, senão humilhá-los. Ele não percebeu isso, e foi até convidado a ir a um famoso programa de auditório em que sua performance de siriema tresloucada seria vista por milhões de telespectadores.

A mãe ficou extasiada; a flor que plantara desabrochara e daria frutos; o pai não levou muita fé naquilo, mas iria ver na tv do celular, pois não teria tempo de ir lá.

E foram lá; a apresentadora, toda solícita e solerte, riu muito com a imitação e até pediu-lhe para fazer uma ao vivo, até chamou ao palco mãe e três filhos que rimavam: "Crisântemo, Cristália e Crisálida"; pronto, eram seus 15 minutos de fama; um pouco mais, até que caíram no esquecimento. Sua vida, a mesma de sempre, entre violências e todo tipo de carência.

Mas Crisântemo deu frutos: três belos rebentos, mas não quis nomes estranhos; chamou-os simplesmente, Pedro, Paulo e João, nomes de apóstolos. E Crisântemo tornou-se, por fim, a fina flor dos vigilantes do shopping do bairro bacana.