IDADE DAS TREVAS
Velho Pedro, um antigo morador da zona rural de Itacoatiara foi convidado pelo presidente da comunidade para mais uma reunião no barracão de palha.
- Seu Pedro, sábado pela manhã o pessoal do luz pra todos vem para nós discutir a respeito da energia e como o sinhô é um dos sócios mais antigos da comunidade, não pode faltar essa reunião.
Enquanto isso velho Pedro cuspe no chão, e de vez em quando faz gestos com a boca, como se estivesse mastigando um tabaco de péssima qualidade.
- Vai tá presente várias autoridades, o presidente do luz pra todos, o vereador Paulo Roberto, o representante do prefeito e o sinhô claro.
- Presidente, eu já participei inúmeras vez de reunião to cansado de promessas e tudo que esse pessoal da cidade inventa é pra lascar a gente do interior.
- Mas seu Pedro, vai ser importante pra comunidade, é projeto do governo, muita gente aí pra cima já foi beneficiada, se nossa comunidade não se interessar eles vão levar pra outro lugar.
- Tudo bem disse o velho Pedro cuspindo no chão, vou pelo menos pra assinar a ata, mas essa reunião não vai dar em nada. Isso é coisa pra enganar besta, é só conversa fiada.
Chega o dia da reunião, seu Pedro recebe até homenagem por se um dos fundadores da comunidade e por relevante serviços prestado, ao final todos assinam a ata. E em poucos minutos o barracão estava vazio. Meses depois a empresa contratada já estava no local perfurando buracos e enfiando postes.
Diante do movimento o presidente da comunidade pergunta a um dos responsáveis pela execução da obra.
- Fica pronto até a festa da comunidade?
Sob um sol amazônico e sem interesse de prolongar a conversa o técnico responde:
- Estamos fazendo o possível para terminar os trabalhos o quanto antes.
Convencido com a resposta o presidente se dirige para o alpendre da casa para consertar alguns furos na malhadeira, sua posição era observadora na expectativa de quem esperava alguém passar por ali, não demorou muito quando Pedro surge no único caminho do lugarejo aos arredores da casa do presidente, desconfiado, sem querer ser notado cuida dos passos desviando das folhas secas ao chão, sem sucesso, pois o presidente de tudo tinha definição, quem chegava quem saia, nada passava despercebido.
- Seu Pedro, exclama o presidente, como querendo se promover diante da situação. A reunião deu resultado, pedi para acelerar a obra, e se Deus quiser via ser inaugurado na festa da comunidade.
Seu Pedro apressado que era sai resmungando e temeroso perder o palpite de que aquela dita reunião pudesse contrariar tudo aquilo que ele já tinha visto.
Enfim, o grande dia chega, eletricistas apostos, comunitários chegando de toda parte, motores rabetas de toda parte já ancorando no porto improvisado, o presidente faz um sinal e alguns fogos disparados no ar faz com que um grupo disperso retome a atenção para o grande acontecimento.
Um desconhecido, dizendo Ser o pai da criança improvisa um discurso e ao final grita:
- Contagem regressiva, 4, 3, 2, 1, luz, palmas e fogos tomaram conta do lugar, o inacreditável estava acontecendo, somente o velho Pedro não queria acreditar que teria saído da escuridão. Passada a euforia o caboclo começava a reclamar dos inúmeros insetos, um adolescente filho de gente importante da comunidade e que tinha os estudos mais adiantados por estar estudando na cidade grande, comenta. Com a chegada do progresso os males de uma sociedade se tornam visíveis, não combate-los é continuar na escuridão.
Fim de festa, cada comunitário se dirigiu para suas casas pra ligar pela primeira vez as luzes de suas casas. Agora o caboclo de nariz empinado iria dormir de luz acesa a noite toda, o lugarejo estava tão iluminado que de longe se confundia com Paris.
Meses depois um homem estranho se aproxima da porteira de seu Pedro.
- Pois não? Pergunta o velho.
- Sou funcionário da companhia de energia e vim trazer a conda de luz.
- Quanto? Seiscentos real, é um rôbo, Reclama o mais ilustre morador.
- Tem geladeira senhor?
- Sim, temos.
- O Senhor tem televisão?
- Sim num tavendo a parabólica?
- O senhor tem freezer?
- Sim, uma pra peixe grande outra pra peixe pequeno
- Essas lâmpadas ficam acesas o dia todo?
- Fica sim, a luz aqui é vinte e quatro horas.
- Pois é, o senhor só vai pagar o que o senhor consumiu.
- Eu num disse que esse negócio de projeto do governo é só pra enganar besta. Mulher vamos nos mudar para algum sítio aqui próximo que o conforto da cidade é só pros bacanas.