A Filha De Dona Lucinha

   Ela tinha na face, tudo o que era de mais lindo no mundo. Era meiga e doce ao mesmo tempo.

   Isso não podia ser verdade, não podia estar acontecendo. Eu era somente um menino inocente, puro, bobinho e sonhador.

   Mas então ela apareceu e de imediato senti que o mundo parou de girar. As árvores pararam de balançar, o vento parou de soprar, as aves que voavam pararam no ar. Até a pipa feita de plástico de mercado estagnou diante dos meus olhos. As outras crianças também pararam, era tudo estranho, mas todas elas estavam imóveis, congeladas, bem ali na minha frente.

   E ela era a única que se movia. Então eu dei alguns passos para trás e quando senti a parede nas minhas costas eu sentei num canto. Olhava-a como se eu estivesse vendo o céu de dentro do mar. Ou como se visse árvores por detrás da cachoeira, era assim que eu via. Enguanto que tudo tinha parado, até o som, eu assustado emudeci.

Ela fingia seriedade com seu rosto perfeito. Traços curvelíneos estampavam a sua fronte. Seus cabelos semi encaracolados eram como riachos em noite sem lua. Um dia iria aprender sobre isso.

Seus olhos eram pequenos e negros, pareciam opalas do universo. Até hoje não consegui definir seus olhos.

Mas o riso era a razão de tudo aquilo acontecer. A menina era a mais bonita de todas as meninas. E eu permanecia ali sentado com medo de assombrar-lhe as vistas.

  Éramos quase cem adolescentes infantis, quase cem meninos incapacitados, afundados ao mesmo instante por ela no tempo.

Então o tempo moveu-se bem devagar. Brincávamos com ela aos poucos querendo um sorriso seu. Outros de nós preferimos não acordar do sonho. E eu o mais idiota de todos, amei. Não sei se esse era o nome do sentimento que vivi naquele momento. Que raiva doce, que ódio romântico meu coração sentiu quando ela me olhou.

   E sem querer tive a infelicidade feliz de olhar dentro dos seus olhos. Foram quase cem anos nos olhando. Eu vi dentro dela e para o meu azar eu esqueci de fechar a porta do meu coração. E com isso ela olhou dentro de mim e descobriu os meus sentimentos. Foi um susto. Se sentado estava e sentado fiquei. E parado acuado tinha medo de respirar. E agora, o que eu iria fazer? Então ela meio que sorriu alguma coisa sincera pra mim e eu ressuscitei.

  Percebi que o velho sol vespertino amigo de tantas tardes me traiu. Ou melhor, se deixou levar pela beleza dela. O sol caçoava de mim. Então ele brilhou num vermelho mais robusto, mais brilhante e mais quente.

   Eu agora seria então o menino mais sonhador de todo o planeta. E levaria pra toda a vida o seu sorriso comigo dentro do meu coração de menino.

  

Hugo Deff
Enviado por Hugo Deff em 29/06/2019
Código do texto: T6684201
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