MALDITA FOME
Aquele lugar era de fato o fim do mundo, lá onde o vento faz a curva e não quer nunca mais voltar.
Denis esperava ansioso um milagre, que sua mãe voltasse a tarde trazendo alguma coisa que lhe enchesse a barriga, algum resto de comida que ao menos aliviasse aquela maldita fome.
Denis só tinha oito anos e já se fazia perguntas difíceis de obter respostas. Deus realmente existe? Por que tanto sofrimento? Qual o tamanho da terra?
Nascido de um “acidente” não conheceu o pai, sua mãe por ter vindo de uma família altamente tradicional mudou-se para aquele fim de mundo com vergonha do que lhe acontecera levando consigo a criança na barriga. Lá Denis nascera e foi o único lugar que conhecera, sobrevivendo apenas com que sua mãe conseguia vendendo a beira da estrada cerca de cinco quilômetros dali, aquilo que produzia na terra que uma alma boa tinha lhe emprestado.
Denis ficavam sozinho o dia todo e quando sua mãe chegava torcia que ela trouxesse ao menos uma salsinha ou uma banda de pão duro que alguém o tinha dado.
A fome era a amiga inseparável de Denis e a solidão sua única amiga de todos os dias.
Certa manhã sua mãe saíra, deu a ele o único bico de pão que havia sobrado da noite anterior, beijou sua testa gelada dando um adeus com as mãos e jogando um beijo de forma carinhosa.
Ao voltar de tardinha havia conseguido naquele dia até mais do que normalmente conseguia, vinha sorridente para dar um jantar mais reforçado a Denis.
Sentiu sua falta ao chegar até a porta e estranhou ele não ir ao seu encontro como habitualmente fazia. Ao adentrar a casa se deparou com a cena que jamais vai esquecer, seu filho deitado ao chão na posição lateral e encolhido. Chamou por seu nome e tocou-o no braço, estava gelado, Denis estava morto.
Seu desespero tomou-a com gritos que jamais alguém ouviu e confundiu-se com os gritos dos bichos selvagens naquela imensidão sem mais ninguém.
Denis desfaleceu e deu seu último suspiro trespassado pelo beijo gelado da morte, acometido por uma doença que mata milhões de pessoas no mundo todos os anos, a MALDITA FOME.
 
JOEL MARINHO