JÁ FEZ BOA AÇÃO HOJE?
Oi! Sou Aninha, a faxineira feliz! Tenho que estar no meu serviço até às 07:30 horas para preparar o café da manhã pra minha patroa, Dona Isabel. Então, antes disso, faço diariamente minha caminhada ao redor da escola que tem aqui bem pertinho do apartamento. Gosto desse exercício, porque enquanto faço, medito. E assim fui meditando…
Como é fácil fazer boas ações ao nosso próximo! Ah que vontade enorme que tenho de fazer uma campanha, tipo assim: “Você já fez sua boa ação de hoje?”
Ou melhor ainda: “Olá para você que está lendo essa mensagem. Escreva na linha abaixo, qual a boa ação que você fez hoje. Como? Não fez ainda? Então faça. Ainda dá tempo. Esta mensagem circulará e provavelmente retornará para você! Daí você estará com sua boa ação feita, pronto para preencher a linha abaixo”.
E eu? Já fiz minha boa ação de hoje? Não. Vim trabalhar de ônibus e até pensei em ceder meu assento para alguém, mas fiz todo o percurso em pé! Então não fiz ainda minha boa ação. Fiquei triste! Mas o dia está apenas começando…
Gostaria de dar um sonoro BOM DIA seguido de um sorrisão, mas encontro vazia a pista de caminhada…
Puxa vida! Será que não vou fazer ninguém feliz hoje? Que coisa mais patética: quero fazer uma campanha que nem eu mesma consigo cumprir! Afe!
E assim continuo caminhando em passos acelerados… terceira volta… quarta volta… na quinta volta encontro o Antônio, um morador de rua que mora na calçada em frente, numa barraca doada por uma alma caridosa. Agora ele não está na calçada em frente. Está bem na minha frente! Atravessou a rua e sentou-se no chão e quase chorando disse-me:
- Oh tia! Estou mal. Não dormi a noite inteira.
- O que foi Antônio. O que está sentindo?
- Dói meu peito quando respiro. Tia! Acho que vou morrer.
- Antônio! Calma... Não fica assim. Será que essa dor é no pulmão?
- Não sei tia. Eu queria um passe de ônibus para ir até o posto de saúde. Ganhei aquela bicicleta velha que tá do lado da barraca, mas não consigo ir pedalando até lá. Estou mal, tia. Pode me ajudar?
- Puxa Antônio. Não tenho passe de ônibus e nem dinheiro aqui comigo! Infelizmente meu amigo, não poderei ajudar. Vai cuidando aí! Assim que passar outra pessoa conhecida, você pede!
Continuei minha caminhada, mas agora chorava. Claro que não deixei as lágrimas escorrerem, mas meus olhos estavam quase transbordando… Sexta volta… Na sexta volta vi que o Antônio batera na porta da escola e estava pedindo ajuda para as freiras.
Na sétima volta, as lágrimas teimosas romperam a barreira e despencaram quando percebi:
- Puxa vida! Eu queria tanto uma chance para fazer uma boa ação e não estava encontrando! Foi Deus que esfregou o Antônio no meu caminho e não pude ajudá-lo. Que raiva e que tristeza! Estou com R$ 50,00 aqui para fazer umas comprinhas para o almoço, no mercado. Não posso dar os R$ 50,00, pois minha patroa ficaria sem os mantimentos… O que eu poderia fazer? Tem que haver uma saída! Já sei! Vou abandonar esta caminhada e vou ao mercadinho agora mesmo! Daí, faço a comprinha, troco o dinheiro e dou R$ 10,00 para o Antônio! Pronto! Está resolvido! Voltei a sorrir novamente!
E assim fiz! Saí em desabalada carreira, mas na volta… Não encontrei o Antônio. Que decepção! Olhei na escola, na barraca, mas nem sombra dele.
Quero crer que as irmãzinhas da escola tenham conseguido dar dinheiro para o Antônio pegar o ônibus ou que tenham dado uma carona até o posto de saúde, com o carro da escola. Portanto ainda não consegui fazer minha boa ação de hoje, mas não faltará oportunidade! E quando ela chegar, não deixarei passá-la em vão, na minha frente! Não vacilarei! Agarrarei com toda felicidade do meu coração!
E você? Já fez sua boa ação de hoje?
Simone Possas Fontana
escritora gaúcha de Rio Grande-RS,
membro da Academia de Letras do Brasil/MS, ocupando a cadeira 18,
membro correspondente da Academia Riograndina de Letras,
autora dos livros MOSAICO, A MULHER QUE RI, PCC e O PROMOTOR
graduada em Letras pela UCDB,
pós-graduada em Literatura,
contista da Revista Criticartes,
blog: www.simonepossasfontana.wordpress.com