Clarinha e Juninho (Parte I)

Clarinha era uma linda menininha, cheia de vida, que do alto dos seus seis aninhos bem vividos, se achava a mais inteligente daquela turminha de cerca de vinte crianças que se juntavam durante toda a semana, naquela humilde e aconchegante creche comunitária, mantida pela paróquia da comunidade onde morava. Ela era filha única; o xodó da família. Seus pais, ainda bem jovens, frequentaram o grupo jovem da paróquia onde se conheceram, e vieram a se casar há pouco mais de sete anos.

Muito curiosa, Clarinha às vezes até enchia a paciência do jovem casal com perguntas "irrespondíveis", tipo: - Papai, me explica uma coisa; se o neném está dentro daquele barrigão da mamãe dele, e ali tudo está fechado; como é que ele consegue respirar? e o que é que ele come?... E quando o seu pai, ou a sua mãe, conseguia 'dar um jeitinho' de encontrar uma resposta; invariavelmente ela mandava outra: -Mas se ele come e respira assim, do jeito que você falou; como é que ele faz cocô e xixi se ele tá fechado ali dentro?... Por onde é que sai tudo?...

E era sempre assim; quando no final da tarde Clarinha chegava da creche, sempre havia alguma novidade para contar ou alguma pergunta cabulosa para fazer. E a sua mãe, que era sempre a primeira a chegar do trabalho, porque ambos trabalhavam, era a sua primeira ouvinte e quase sempre o alvo das suas perguntas. Assim era a Clarinha; uma menina muito curiosa e com uma inteligência muito acima do normal para crianças da sua idade.

Clarinha havia começado no início daquele ano a fazer a pré-catequese na paróquia frequentada por seus pais. Era muito querida pelas catequistas, mas também era temida por causa das tais perguntas "irrespondíveis" que costumava deixar algumas delas de 'saia justa'.

Ora, naquele pequeno grupo de crianças que se reuniam no salão paroquial, nas manhãs de domingo, para a catequese, havia um menino muito espevitado: o Juninho. Juninho era exatamente o oposto da Clarinha; não parava um minuto quieto no seu lugar, falava sem parar, interrompia as 'tias' a todo o momento pedindo para ir ao banheiro, beber água, etc... Mas havia um particular bem interessante; ele havia nascido justamento no mesmo dia em que Clarinha nasceu... Como seus pais se conheciam, costumavam fazer as suas festinhas de aniversário em conjunto; era bem prático e, acima de tudo, mais econômico. Com isso, havia entre os dois uma amizade muito incomum; eram como se fossem irmãos. Na creche em que ficavam enquanto seus pais trabalhavam, Juninho se achava um 'super-herói'. Era ele quem 'mandava no pedaço' e Clarinha, como seria de se esperar, era a sua heroína; a sua protegida. Era a única menina a quem ele ouvia, porque achava que os meninos não deviam se misturar com as meninas, e ao final da tarde eles invariavelmente saiam juntos, pois ora era a mãe da Clarinha que levava os dois, ora era a mãe do Juninho...

Até que em um fatídico fim-de-semana prolongado, um grupo de famílias de moradores da comunidade foram em uma pequena excursão para um sítio em uma cidade serrana, para uma confraternização de amigos. Naquele grupo estavam também os pais da Clarinha e do Juninho que, obviamente, não se continham de tanta alegria por aquele passeio por lugares nunca vistos pelos seus olhinhos curiosos.