Uma mosca falou comigo

Recordo-me que se tinha aberto um sol furibundo, e as brisas sopravam numa velocidade angustiante. Foi nessa tarde de verão em que uma mosca falou comigo.

Encontrava-me eu, sentado num banco feito de madeira já gasto, num parque raramente deserto em Lisboa, quando a mosca descansou sobre o meu ombro e chamou por mim. Antes de achar que tinha enlouquecido, procurei em volta pelo dono da voz que me tinha chamado e, para o meu desencanto, não vi ninguém. A mosca sussurrou-me (pelo menos parecia-me ter sussurrado) o nome novamente. Olhei para o meu ombro esquerdo e dei por ela. Observava-me a viajante, com olhos familiares, como quem já me conhecesse de tempos passados. Acredito eu que, a ouvi a suspirar de alívio.

Dissera-me ela, que vinha de muito longe enviar-me boas novas da minha tia Poldina. Chamava-se Zola, a mosca. Dizia-me Zola que a minha tia vinha para Portugal, de Angola, visitar o seu querido sobrinho. Era suposto ser uma surpresa, mas, decidiu avisar-me, pois, vinha com a tia Poldina, uma jovem mulher para se casar comigo.

De acordo com a mosca, a jovem era linda, de pele negra brilhante e impecável, corpo esbelto e com uma carapinha bem tratada, via-se que cuidava da mesma com devida atenção. Zola não me disse o nome da moça, queria que se mantivesse em segredo até a chegada das duas mulheres. Zola, a mosca, não me falou muito mais sobre a jovem, apesar das minhas intermináveis questões.

Zola vinha de Luanda dar-me notícias, isto sim era um evento que me parecia intransponível. Porém, eu acreditei como se não tivesse sido uma mosca a contar-me as novidades.

Ela era-me indecifrável. Talvez por ser uma mosca, e eu nunca tivera a oportunidade de conversar com uma.

Agradeci a Zola pelo comunicado e convidei-lhe a ir até casa comigo, para comer os restos do meu almoço. Achei que fosse disso que ela gostava. A mosca luandense amistosamente recusou e saiu a voar. E eu fiquei pelo parque até que o sol se acalmasse.