2 HISTORIETAS BARATAS
2 HISTORIETAS BARATAS
No começo o assistente da diretoria da Academia estranhou aquele sujeito esquisito, entrando nela assim que abria as portas (eram 2, uma menor na lateral), lá pelas 5 da tarde, 5 e meia. Sempre que anunciavam sarau literário, lá estava êle... ficava a olhar os quadros nas paredes, "conversava" com alguns, dir-se-ía que os conhecera em outra época. Com o tempo o funcionário acostumou-se, o gajo era assíduo aos eventos embora nada declamasse ou lesse ao público.
Naquela tarde-noite lá estava êle, ar feliz, aplaudiu tudo e todos, em evento literário iniciado pelas 19 horas. Pouco depois algo começou a incomodá-lo, franziu o cenho, afrouxou o nó da gravata. O chamaram para a leitura de um poema vencedor, o autor estava ausente. Hesitou, insistiram... foi ! Voltou a sorrir, feliz consigo mesmo, o copinho de vinho barato a fazer seu efeito. Mas a sensação de algo errado não o deixava, as orelhas "queimando" ao sinal de alerta do cérebro enevoado. Não conseguia atinar com o tipo de perigo que o rondava, o sarau estava ótimo, as poesias eram lindas.
A noite já ía alta, quando renomado escritor pediu silêncio e, lamentando, informou que já eram 10 e meia da noite e êle precisava sair.
-- "Santo Deus, 10 e meia... minha mulher vai me matar" !
O velhote saiu aos saltos do salão, derrubando no chão papeizinhos com anotações de poemas e seus autores. Atravessou a ruela escura às pressas, "tomando de assalto" o primeiro táxi que avistou, do qual descia um passageiro. Ao motorista assustado quase berrou:
-- "Rua das Flores, amigo, o mais rápido que puder" !
Chegou depois das 11 da noite, com sua casa meio às escuras, luz na varandinha e outra "saindo" da janela da cozinha. Estacionara o táxi 50 metros antes, mas o vira-lata da vizinha o denunciou. Tirou os sapatos, girou a chave com extremo cuidado, entreabriu a porta, enfiando a cabeça encanecida na sala na penumbra. Sorriu aliviado, entrou e... caiu duro no tapete gasto, com a sensação de ter visto "sua velha" rindo com a dentadura recém-comprada.
Na manhã seguinte a casa estava em polvorosa, com polícia, ambulância e vizinhos curiosos tentando se inteirar sobre o ocorrido. Umas 20 e tantas horas depois o jornal "mancheteava":
"Mulher ciumenta "amassa" marido com rolo de macarrão" e os detalhes do caso, com o esposo avariado lá na UTI, traumatismo craniano e hematomas em boa parte do corpo. A esposa Joana Barata não foi presa... não havia testemunhas da agressão e ela "dormira" a noite toda, mas o canalha "lhe traía" fazia anos e anos.
*** *** ***
No belo jardim da casa do dr. Barata, entre flores e palmeiras anãs, conversavam animadamente o "Pulgão" e a "dona JOANINHA":
-- "Eu não te disse, "Pulgão", aquela desclassificada virou amante do Baratão... não sei o que êle viu nela" !
-- "A senhora tem certeza ? Êle é casado e a esposa é braba pra xuxu"!
-- "Eu lá sou mulher de mentiras ? Eu vi os 2 saindo detrás do armário da dona Maricota... uma "pouca vergonha", o que êle viu nela que eu não tenho" ?
Enquanto fofocavam, dentro da casa o doutor Barata preparava o casório de uma de suas "Baratinhas". (Em tempo: não se trata do dono de uma frota de ônibus, esse é apenas comprador de "ferro-velho".)
-- "Eu podia estar na festa, mas não... êle se esbalda com aquela "prostirata" ! "Pulgão", você vai contar tudo pra esposa, aquela amante "vagaba" está com os dias contados" !
-- "Deus me livre, o Baratão me mata... os 4 braços dele têm garras mortais. Além disso a "Verinha Barata" é minha amiga ! Fale a senhora mesma" !
-- "Você é um inútil nojento, homem nenhum presta" !
-- "Pô, assim a senhora me ofende" !
-- "Huuummm, tens razão, INÚTIL você sempre foi, mas retiro o NOJENTO... me desculpe" !
Enquanto proseavam, um casal de namorados afoitos foi ao jardim para aquela "esfregação" desavergonhada que não pode ter testemunhas. Um sapato 44 bico fino "encerrou a carreira" dos fofoqueiros de forma esmagadora, com o Baratão -- num outro canto do jardim -- "montando a cavaleiro" na "Verinha barata" para mais uma tarde de esbórnia e devassidão. Já a esposa "se entupia" de doces na cozinha !
"NATO" AZEVEDO (em 19/fev. 2019)