Tristeza vs. Raiva, O Conto.

Tristeza x Raiva

Louis chegou em casa banhada em lágrimas. Seus olhos estavam inchados e seu rosto vermelho. Apressou-se em comentar que não estava com fome e que não queria por nada ser perturbada. Seu pai, como sempre, se ocupava no trabalho. Sendo sua mãe a única presente para segurar toda a barra. Ela pensava em um meio de transpassar a impenetrável barreira da tristeza.

- Lu! – chamou Izabele – minha filha, eu trouxe uma coisa.

- Não me importa, vai embora.

- É chocolate, querida. Não quero que estrague.

- Eu não estou com fome.

- Muito bem. Vou deixar na porta.

E como calculado, minutos depois a filha desce. Sua face havia passado para o roxo e grossas rugas apareciam por entre seus olhos. Ainda com um pouco de soluço, sentou-se ao lado da mãe.

- Quanto estiver pronta...

- Foi o cafajeste do Pedro.

- Ah! Seu namorado de porcelana?

- Não é hora de brincadeiras, mãe!

- Tudo bem, me desculpe. Continue.

- Ele terminou comigo, disse não mais sentir aquela atração de antes. Falou algo como nossa relação ter ficado muito rotineira.

- Rotineira? – Perguntou a mãe.

- Era tudo a mesma coisa. Nossos encontros não passavam de rotina, como obrigação para continuar-mos juntos. Eu o odeio, odeio com todas as minhas forças.

- Por que diz isto, querida minha? O que ele fez?

- Eu tive tanta paciência no nosso namoro. Esperei tanto por ele, me doei tanto. Ele me deu foras, não me deu a atenção que eu devia por várias vezes, saía em festas que não gosto que ele saísse...

- Já entendi...

- Não, mãe, você não entende. Não passou por isso. Você tem ao papai.

- Não passei? Minha filha, tem muita coisa na vida de sua mãe que você desconhece. Já tive que enfrentar duras barreiras antes de me casar com o seu pai.

Dona Izabele bateu suas mãos em seu colo, oferecendo-o à sua filha. Logo, a garota cedeu e repousou sua cabeça nele, enxugando as lágrimas. A mãe, gentilmente, acariciou os cabelos da filha enquanto começou a história:

- Eu e Mauro, seu pai, nos conhecemos desde muito tempo. Ele não foi o primeiro homem que namorei. Tornamos-nos melhores amigos quando entramos na mesma turma da escola, na quinta série. Por sermos tão novos, o sentimento de desejo nunca passou pelas nossas mentes.

- Ao fim do meu terceiro ano, seu pai e eu ainda éramos os melhores em nível de amizade, isso deixou alguns dos meus namorados bem chateados. Neste período, um tal de Jorge, que eu havia estado junta por dois anos, terminou comigo.

- Ah! Que pena mamãe!

- Que pena? Coitado do seu pai se ouvisse isso!

- É! Me desculpa...

- Foi exatamente como aconteceu com você – continuou Izabele – mas com alguns fatos a mais. Ele morria de ciúmes do Mauro. Porém, de acordo com ele, seu motivo maior, foi a mesmice com que o nosso relacionamento caminhava. – terminou encarando a filha.

- O que aconteceu?

- Fiquei com raiva, muita raiva. Ainda gostava muito do Jorge. Era capaz de mudar para continuar com ele, mas aquela tinha sido sua última decisão. Meu ódio afetou muita gente. Seu pai foi quem sofreu mais as conseqüências. Briguei com ele e descontei todo ódio do meu “ex” nele. Lembro-me de bater a porta da minha casa na cara dele. Obviamente, me arrependi depois, mas já era tarde.

- Quase três semanas, fiquei sem falar com ele, não por raiva, por vergonha. Ele também parecia não se importar muito com nossa distância. Certo dia, recebo uma carta. Uma carta dele. E acredite, minha filha, esta carta me fez, alem de esquecer meu ódio e me fazer pedir perdão ao Jorge pelos xingamentos, começar uma quase paixão pelo seu pai. Aí que começou.

- O que havia na carta?

A mãe, com todo carinho do mundo, levantou a filha para também se postar de pé. Foi ate o quarto e voltou trazendo em suas mãos um papel antigo. Já todo desgastado pelo tempo, com sua coloração amarelada e cheio de buracos de traça.

- Quero que leia. Não precisa ser agora, mas saiba que quanto antes melhor.

Louis subiu as escadas em direção ao seu cômodo, deitou-se na cama e, mais pela curiosidade do que por qualquer outra coisa, começou a ler:

“Querida Izy,

Eis aqui um texto que escrevi para que se sinta melhor.

O que é comum vermos e presenciarmos em situações de rompimento de relacionamento? Seja namoro ou casamento. Ódio, rancor, desgosto, raiva...

O estudo do pensamento humano não é baseado sempre na lógica. Apenas em um robô, através da pesquisa de sua programação, pode-se saber o que ele é apto a fazer em diversas e diferentes situações. Porém, é por ela (lógica) e pela convivência, que escrevo este texto.

De todos os casais que se separam, há apenas uma pequena parcela em que ambos ficam em um estado de espírito estável. E dentro desta primeira, uma outra, menor, existente em que o casal continua verdadeiramente amigo.

Será que isso é aceitável? Para espectadores, cuja vida não os castigou à esse respeito, não!

Este, já mencionado, pequeno número de pessoas que rompem e continuam com um sentimento de amizade, provavelmente (visto que a mente humana é de difícil análise), passaram por essa difícil situação por consentimento mútuo, ou seja, o término do relacionamento veio por vontade das duas partes, não apenas de uma.

O problema aparece no momento em apenas um dos dois sente a vontade de romper, enquanto o outro, ainda possui uma paixão pelo parceiro (afirmo que a tristeza, normalmente, é proporcional ao nível de paixão). Quando a hora é chegada, o sentimento da tristeza é o primeiro que domina. Segue aí o desespero, dando lugar em seguida à raiva.

Sem aviso, passam flashs em sua mente. Momentos em que teve rancor do companheiro ou que se enojou por estar junto dele. Todas estas lembranças vem à tona, e são, por conseguinte, jogadas em cima da pessoa que você pensa ser a culpada. Fato simples de ser explicado. Em todos os casos onde dá algo errado, sempre deve haver um culpado, mesmo quando ninguém se pronuncia. Neste episódio, em que você está sendo empurrado para trás, quem irá culpar? Pais? Irmão? Amigos? Ou a própria responsável pela notícia?

É muito baixa a quantidade de pessoas que se responsabilizam pelos próprios atos. Você escolheu namorar. Você escolheu não lembrar do dia de namoro. Você escolheu não convidá-la para sair naquele feriado. Você... Em suposição, se o relacionamento tenha terminado pela famosa “falta de química (acontece...)”, assim mesmo, terá que reavaliar o que poderia ter feito de errado. “Pegue as pedras que passaram pelo seu caminho e construa mais tarde um castelo”.

Não que seja preciso sentir raiva do outro. Não é!

Para ser mais claro, darei um exemplo. Imagine você em uma situação em que é constrangido e humilhado por um desconhecido em meio a uma multidão. Como se sentirá? Por outro lado, agora se realize enterrando um parente muito querido. No primeiro, me refiro ao ódio que tomará posse de você, com o certo desejo de vingança. Provavelmente, pagando na mesma moeda, se sentirá melhor. Engana-se o leitor que pensar que incentivo a vingança (foi apenas a descrição de como funciona a máquina humana). No segundo caso, por mais que chore e lamente, nunca deixará que se sentir triste e magoado com o acontecido, nunca deixará de sentir saudade.

Por fim e em resumo, é mais fácil aturar a raiva e o ódio do que a saudade e a profunda tristeza. Claro que há casos em que a relação está desgostosa, mas o habito a mantém firme, sendo assim, existirá só uma diminuta angústia por não estar mais junto de alguém.

“Ás vezes deve-se escolher entre o que é fácil e o que é certo”

Isto não se trata de uma auto-ajuda, mas de uma reflexão.

PENSAR no motivo que levou seu parceiro à terminar e REFLETIR se há algo que o dê RAZÃO para sentimentos maldosos. Seja-mos todos pessoas humildes nas horas certas. Isto pode salvar e reconstruir uma bela amizade.

P.S.: Eu ainda amo você!

De seu sempre melhor amigo,

Mauro de Farias.”

Estava pasma. Na leitura, sua mente viajara para as palavras contidas no texto. E agora, ao término dela, não havia muito o que pesar. Deixou a carta de lado e aconchegou-se melhor na cama. Dormiu. Apenas acordou quanto era noite. Seu pai já estava em casa, com seu irmão, um ano mais novo, na sala lendo seu livro.

- Como está, meu anjo? – Pergunta a mãe vendo-a descer.

- Melhor!

- Não se preocupe, não contei ao seu pai.

- Obrigada, mãe!

Com um belo sorriso no rosto, e como se tivesse saído do fundo de um enorme e escuro poço, beijou e abraçou dona Izabele, em seguida a seu pai, que a olhou abismado. Dirigiu-se ao irmão para sentar do seu lado e começar umas boas brincadeiras.