A Casa
Nem sempre fora assim. A nova casa, moderna, que agora impunha respeito era uma antiga e aconchegante casinha, parte de tijolos, outra de madeira, separadas por uma simples escada de concreto, pintada de vermelho, de apenas três degraus. Estes levavam até a cozinha, onde um velho fogão a lenha acompanhava outras peças em igual condição, conduzindo quem a visitava a um espaço do início do século.
Do fogão saíam os melhores quitutes, doces, salgados, nos almoços, jantares e cafés, sempre temperados com o sincero e aconchegante amor de mãe, avó e “bisa”. Após as refeições, nos reuníamos para um gostoso bate papo ou simplesmente descansávamos à refrescante sombra de frondosas árvores frutíferas, cujas copas se entrelaçavam, em antigas e rústicas espreguiçadeiras e, por vezes, colhíamos e desfrutávamos de deliciosas e frescas goiabas, tangerinas e laranjas-lima, diretas do pé, com um simples esticar de braços.
Crianças, brincávamos de esconde-esconde, futebol, líamos histórias de heróis em lindos e ilustrados livros de contos trazidos pelos mais velhos, ou encontrados em um pequeno baú cor ébano, abandonado no canto de um quarto vazio. Ouvíamos as histórias da “vó Tonha”, de lutas, alegrias e tristezas, mas de muita valia e ensinamento para nós.
Estas felicidades perduraram anos, perpassando por nossa adolescência, chegando até nossa vida adulta. As histórias, antes variadas e encantadoras, ficaram escassas, repetidas e prendiam a atenção de poucos que ainda visitavam a querida avó em sua velha casa. Do alto de seus noventa anos dizia querer morrer como um passarinho, sem “amolar” ninguém. Combalida e enfraquecida pela enfermidade e o peso da idade, foi silenciando até calar-se definitivamente em uma fria noite. Despediu-se a “vó Tonha”, foram-se histórias, brincadeiras e descansos e, com a reforma, foi-se a antiga e aconchegante casinha. Sem árvores frutíferas ou espreguiçadeiras, o espaço do terreno onde estavam, encerrava apenas uma nova e moderna casa, que impunha respeito aos caminhantes.
Carmo Bráz de Oliveira