ERVILHAS E ATUM
Aquele rosto morto, ensacolado pelo inverno do ano mais triste e doído de sua vida, acordou juntamente com ela para mais uma quarta-feira. E todos os dias da semana se pareciam iguais. Domingo à tarde e uns dois dias por mês é que era diferente. Mas tempo apenas para descansar e organizar as coisinhas em casa.
O supermercado com suas prateleiras cheias de produtos necessários a todos os padrões de consumo na cidade engaiolada pela pressa e falta de poesia da mulher e do homem que traz atravancado em seus tornozelos os grilhões da sobrevivência, a esperava para engoli-la por uma longa jornada de trabalho, e depois vomitá-la, expelindo-a através dos logradouros do bairro operário para dentro da sua caixinha de alvenaria para a qual dão o nome de casa.
R$ 53,00. Ele lhe entregou R$ 60,00. Ela lhe devolveu R$ 7,00 enquanto que a empacotadeira colocava num misto de pressa e cuidado os pacotes de cereais e latas de conservas em sacolas de materiais nada degradáveis. A matemática naquele instante foi simples demais. Mas na quinta cavidade do seu coração, aquela invisível a qualquer raio-X faltava algo. O troco que a vida havia lhe dado não era o suficiente diante da perda que teve. Tinha sido deixada por aquele homem que a havia preenchido de carinho e decepções nos seus últimos sete anos de sobrevivência.
Desde então a jornada, para a sua sensação, havia se tornado o dobro mais árdua. E ele, aquele desgraçado, estava comprando aqueles cereais para quem? E aquela latinha de ervilha?
Era a primeira vez depois da separação que ele entrava no supermercado e passava diante dos seus olhos. Tanto ele quanto ela agiram com naturalidade, a mesma de quando estavam juntos e ele ia lá, comprar o que ele tinha vontade. O homem durante sete anos gostava de atum e detestava ervilhas.
A empacotadeira sorriu com o canto da boca quando ela abaixou a cabeça para respirar fundo. Pensava qual seria a reação da caixa quando soubesse para onde estava indo aquela mercadoria. Nesse mundo sem poesia, sobrava drama mesmo no recheio da dureza operária.
Fim da jornada. As duas almas femininas e famintas tomaram o rumo de suas casas. A empacotadeira subiu a ladeira feliz. Iria desfrutar de sua conquista e discutir com ele como contaria para a colega de trabalho. Não poderia segurar tamanho segredo por tanto tempo.
Ela caminhou cabisbaixa, derrotada, pela avenida até entrar na ruela em que morava. Abriu a porta e sentiu o cheiro de comida sendo preparada. Era ele ao fogão. No jantar haveria atum para ele e ervilha para ela em celebração ao seu retorno inesperado.
A empacotadeira chorou diante do bilhete de despedida sem ter forças para encarar a colega de trabalho no dia seguinte. Resolveu não ir mais.
O supermercado com suas prateleiras cheias de produtos necessários a todos os padrões de consumo na cidade engaiolada pela pressa e falta de poesia da mulher e do homem que traz atravancado em seus tornozelos os grilhões da sobrevivência, a esperava para engoli-la por uma longa jornada de trabalho, e depois vomitá-la, expelindo-a através dos logradouros do bairro operário para dentro da sua caixinha de alvenaria para a qual dão o nome de casa.
R$ 53,00. Ele lhe entregou R$ 60,00. Ela lhe devolveu R$ 7,00 enquanto que a empacotadeira colocava num misto de pressa e cuidado os pacotes de cereais e latas de conservas em sacolas de materiais nada degradáveis. A matemática naquele instante foi simples demais. Mas na quinta cavidade do seu coração, aquela invisível a qualquer raio-X faltava algo. O troco que a vida havia lhe dado não era o suficiente diante da perda que teve. Tinha sido deixada por aquele homem que a havia preenchido de carinho e decepções nos seus últimos sete anos de sobrevivência.
Desde então a jornada, para a sua sensação, havia se tornado o dobro mais árdua. E ele, aquele desgraçado, estava comprando aqueles cereais para quem? E aquela latinha de ervilha?
Era a primeira vez depois da separação que ele entrava no supermercado e passava diante dos seus olhos. Tanto ele quanto ela agiram com naturalidade, a mesma de quando estavam juntos e ele ia lá, comprar o que ele tinha vontade. O homem durante sete anos gostava de atum e detestava ervilhas.
A empacotadeira sorriu com o canto da boca quando ela abaixou a cabeça para respirar fundo. Pensava qual seria a reação da caixa quando soubesse para onde estava indo aquela mercadoria. Nesse mundo sem poesia, sobrava drama mesmo no recheio da dureza operária.
Fim da jornada. As duas almas femininas e famintas tomaram o rumo de suas casas. A empacotadeira subiu a ladeira feliz. Iria desfrutar de sua conquista e discutir com ele como contaria para a colega de trabalho. Não poderia segurar tamanho segredo por tanto tempo.
Ela caminhou cabisbaixa, derrotada, pela avenida até entrar na ruela em que morava. Abriu a porta e sentiu o cheiro de comida sendo preparada. Era ele ao fogão. No jantar haveria atum para ele e ervilha para ela em celebração ao seu retorno inesperado.
A empacotadeira chorou diante do bilhete de despedida sem ter forças para encarar a colega de trabalho no dia seguinte. Resolveu não ir mais.