Vinha pela rua com dificuldade de caminhar, chovia, devia ser por isto que sentia que a rua se movia embaixo de seus pés. Encostou-se à parede úmida e seu corpo desliza. Já não recordava mais porque estava assim, havia apenas tomado uns chopes com a turma.
Haveria se passado?
Escorrega devagar e cai numa poça de água. O frio o faz sentir vontade de urinar. Um jorro quente escorreu entre suas pernas, sensação sentida somente quando era um menino pequeno. A imagem turva de sua mãe apareceu diante dos seus olhos com um chinelo na mão. Ainda que estivesse bêbado, sua consciência assinalava-lhe que algo estava muito mal. O superego tentava levantá-lo em vão. Um sono chegou devagarinho e o adormeceu ali mesmo perto do degrau da escada da Igreja Matriz do bairro.
Cada pessoa que passava lamentava que um rapaz tão bem apessoado estivesse naquele estado atirado no chão. A madrugada foi chegando regada pela chuva fina que seguia insistindo em encharcar sua roupa e todo o ambiente.
Seu All Star novinho mudou de dono e o relógio o acompanhou. Um Cassio que havia recebido de presente de sua namorada. Entre os poucos pertences que sobraram estava sua calça jeans já surrada que ele adora e no bolso de trás a chave do carro.
A manhã o surpreendeu ali encolhido, quase congelado, quando foi despertado pelo sacristão que chegava cedinho para ajeitar a igreja para a missa.
- Rapaz o que aconteceu? Foste assaltado?
- Nada, nada!- Levanta assustado o bêbado do outro dia.
Cai outra vez sobre a calçada. Sua cabeça parecia um redemoinho.
- Ah! Já vi tudo andaste tomando uns tragos a mais. Te depenaram velho. Diz o sacristão- Ajuda-o a levantar e pega os documentos que estavam atirados junto a ele.
- Ai que dor de cabeça! – geme Arnaldo.
Arnaldo era seu nome. E escuta o sacristão falando junto a ele:
- Venha, vou preparar um café para o pároco e para mim e te convido. Venha, tenho umas roupas lá dentro e poderás tirar estas molhadas. Sorte que me recordei do teu rosto, acho que te vi alguma vez.
- Deve ter sido no meu trabalho, sou funcionário do banco do bairro. Não moro aqui perto, nem lembro onde deixei meu carro. Ai minha cabeça. - Geme desequilibrando-se.
- Roubaram quase toda minha roupa! Meu relógio novo, meus tênis, bah, que droga.
E aquele superego que o tentava levantar ao início de sua caída lhe envia mensagens de que havia se sobrepassado. E sua alma desliza parede abaixo como se estivesse embriagada de vergonha.

 
Isiara Caruso (IsiCaruso)
Enviado por Isiara Caruso (IsiCaruso) em 15/08/2018
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