Passado e Presente
O ano era 1960. Estava na mais pura inocência que a adolescência podia transmitir a uma jovem sonhadora, que espera para poder desabrochar todo o charme que trazia consigo. Era loira, olhos azuis, lindos por sinal, esbelta, corpo esguio e bem contornado. Uma pele aveludada e uma boca carnuda que chamava a atenção de qualquer cavalheiro que passava ao seu lado. E chamou. O sol raiava sobre aquele lindo lugar verde, a cor que estampava aquele lugar, aquele paraíso. Era domingo, domingueira. A mocidade daquele lugar sabia que seria o dia que poderiam trocar olhares, poderiam passar uma mão na outra ou até mesmo uma piscada indecente. Esperavam o ano inteiro para aquela festa, para aquele dia, para festejar o dia do padroeiro da comunidade.
A troca de olhares entre aquela moça linda e um belo rapaz filho do Seu Meni (nome do pai do rapaz, muito conhecido na comunidade) foi incontrolável. O rapaz, muito simples, mas muito respeitoso, tira seu chapéu e lhe faz sinal de respeito deixando-a corada, confusa e acanhada. Aquela tarde de domingo, de domingueira, nunca mais acabara. Não nos sonhos daqueles dois, cujos olhares não havia outro destino senão o olhar de um e de outro. E foi um sonho sem fim, duradouro, que trouxe para este mundo alegrias e muita felicidade.
O ano era de 1987. Estava na mais pura da inocência que a infância pode transmitir a uma criança linda e sonhadora. Uma criança que adorava ouvir da sua mãe e de seu pai, a história de como haviam se encontrado e se visto pela primeira vez. Todas as noites, essa criança e seus pais, sentavam a beira do fogão a lenha, local preferido daquela casa simples, humilde, porém, aconchegante e com cheiro de felicidade. Sentavam ali para contar/ouvir histórias do passado, do passado que lhes pertenciam, que fazia reviver aquela mocidade linda e inocente. Essa criança, sentia-se feliz, sentia-se protegida, sentia-se amada. Era a história de seus pais, era a história dela. Era um passado que fora a raiz do seu presente.
O ano é 2018. Está na mais pura da inocência que a memória pode trazer a uma pessoa sonhadora. Uma memória linda, pura e com a certeza que tudo o que vivera até ali, valera a pena. Essa certeza está nas lembranças de uma infância feliz, as vezes dolorosa, mas feliz. Essa certeza está nas lembranças de que tudo o que tivera vivido naquela casa simples, de madeira, madeira bruta, entretanto repleta de harmonia e amor, viveria novamente. Uma certeza que vem com o cheiro, áh o cheiro. O cheiro é o mais puro do aroma que esta pessoa ainda pode sentir. É a mais pura das lembranças que esta memória pode transcrever. Um cheiro de família, um cheiro de amor, um cheiro que apenas o sonho pode nos roubar. Áh o sonho, o sonho perdurou por mais de 48 anos, quando de repente, ele foi separado pela morte. Mas as lembranças, as memórias ainda estão vivas no coração. E viverão para sempre dentro dele até que novamente a morte seja o motivo da separação deste sonho.
Hoje, este sonho está aqui, sendo vivido e relembrado por uma infância que fora a raiz do “meu” presente.