O que houve, garoto?
Lá estava ele, na rua. Sentado na calçada, de cabeça baixa. Alvo dos olhares de reprovação, pois chorar não é propriedade de sua raça. Só poderia, penso, ser por alguma negligência amorosa. Então, por curiosidade, que associo a solidariedade, me aproximo em busca de oferecer suporte.
- Hey... você está bem? O que houve?
Pus-me a uma distância razoável, o suficiente para tocar-lhe o ombro. Entretanto, só recolho resistência. E para fim, agora que estava envolvida, só restava-me a missão de resolver, pois se não, seria eu a ser alvejada. Percebo, por leve, que os murmúrios haviam cessado. Sento ao seu lado, e tento novamente.
- Estou tentando lhe ajudar. Está perdido? Machucou-se com algo?
- Sai... Não quero ajuda de ninguém! - Suas primeiras palavras com objetivo de serem as últimas, acertaram-me em um tom juvenil.
- Olha, só estou tentando entender o que está acontecendo. - E em uma investida adulta, conjuro-o à realidade de sua vergonha em público - Estão todos lhe olhando, preocupados com seu estado. Então, só estou aqui para tentar ajudar. Pode me contar o que houve?
O silêncio perdura por mais alguns momentos. Logo houve uma mudança na sua postura, um rastro de relaxamento, e, posteriormente, dois suspiros seguidos do desabraçar de sua face dos braços encharcados.
- Me roubaram. Levaram meu celular de novo! Minha mãe acabou de comprar, pois, duas semanas atrás, quando estava saindo de casa para ir na casa de um amigo, tinham me roubado. Eu não sei o que fazer. E nem tenho como ligar pro pai vir me buscar, porque levaram até minha carteira. Estou preso aqui...
- Calma. Você sabe o número dos seus pais? Posso tentar ligar para eles aqui.
-Não... Tava na agenda.
- Tem alguma outra pessoa pra quem possa ligar? Mãe, tia ou um amigo? Ou você mora muito longe?
- Não sei o número de ninguém. Moro meio longe, num bairro onde tem uma praça grande com uma igreja. Meu pai sempre me trás e me leva de volta, mas quando não pode, pede pra mãe vir ou minha tia.
- Entendo... Não sabe o nome do bairro ou da rua? Não tem como ir de táxi?
- Não sei... Quando vou, fico jogando ou lendo algo, nunca prestei atenção no caminho.
- E eles te deixam andando sozinho aqui?
- Normalmente, venho só ver um filme e comer algo, ai volto pra casa. Mas tinha uma galera legal que me chamaram pra ir com eles. Pediram pra mim vir aqui na parada com eles, então pensei em ligar pro pai quando eles fossem, e eles levaram minhas coisas tudo quando ficamos aqui sozinhos.
- Teus pais não te ensinaram que não pode confiar em todo mundo? Que descuidado...
- Eles até falam, mas dizem que por ser homem, tenho que saber me virar sozinho. Mas eu quase não saio... Eles nem pareciam que iam fazer isso. Sei lá...
- Complicado. E não tem uma casa de outro parente que saiba onde ir sozinho? Tipo, posso te levar lá.
- Minha tia. Ela mora atrás de um universidade, mas é longe de casa.
- Porém, é a única saída. Vamos lá. Lá eu tento explicar.
- Tá bom...
- Mas não é só porque você é homem que vai saber lidar com todos os problemas. É difícil, hoje, saber em quem confiar. Vocês também precisam de cuidados e atenção. Vamos lá. - levanto a mão e chamo táxi.