Ziguezagueando 31
Nos primórdios, na Grécia antiga, antes da era socrática, que foi por volta de antes do século IV a.C., o ser humano tinha um relacionamento íntimo com a natureza, aquela realidade primeira, que entenderam depender inevitavelmente para serem na existência, na vida do próprio corpo, e para a do meio em que viviam.
Se identificavam com os deuses, que saiam do imaginário coletivo, como ideal para perfeição, passando considerá-los como seres supra-humanos, mais adiantados na compreensão das verdades últimas.
A partir da criação ideal do homem perfeito, pelos gregos antigos, estabeleceram caminhos para a busca da realização dele em cada um.
Desejavam viver de forma plena e satisfativa, buscavam aquele afã para o heroísmo. A busca do homem perfeito era a moda. Aquele que ficava num lugar inatingível, o herói de si mesmo, detentor do poder do livre arbítrio para ver à distância, e acertar nas escolhas quando colocadas em prática. Queriam serem os primeiros a se regozijarem por defender o coletivo na guerra, preservando a paz.
Foram os construtores da base ética e moral do nosso tempo, desenharam de forma rica em aceitação lógica, o que precisaria para o grupo e o indivíduo serem bons, a pratica de ações que os conduzissem para o bem coletivo. Além de preceitos valiosos para o homem encontrar e permanecer em felicidade.
Foram os idealizadores da forma arquetípica materializada do ser , usada como parte de um conjunto de pedras angulares vindas de outras culturas, que são a base moral e ética do homem moderno.
Jovita e Hugo representa em clareza de detalhes o que este ser humano do agora, depois de mais de dois mil anos, tentam realizar, buscando pelas beiradas sair do niilismo, da angústia provinda da falta de significação para o viver, do estado de perdidos , desconectados das habilidades de cada um em praticar e relacionar-se afetivamente, consigo e com o outro.
Indicam estarem tentando o reencontro com este subjetivo esquecido, inutilizado pelo desenfrear da técnica, lado do fazer do homem, que foi e se expandiu no externo.
Apesar de ter se tornado dominante da natureza no ato da manufatura dela para o ter, a humanidade tornou-se a principal prejudicada, estéril de significado para Ser em meio a tanto.
Busca o casal pelas beiradas, o retorno para o interior de si mesmos, usando um e outro. Tiveram uma pitada de sorte, ou até mesmo beneficiados pela coincidência, ou providência divina, no encontro nesta vida.
Se massageiam pelas mãos e almas no refazerem-se para o retorno às suas próprias naturezas, essências diamantinas que buscam desesperadamente se extravasarem, irem além do que a lógica os levou.
No silêncio da estória contada, percebe-se uma fadiga latente em Hugo e Jovita, que apesar de estarem para o amor, que se manifestou entre os dois, ainda insistem em ruminarem um pedido de interação consigo mesmos para completude interior nas suas individualidades.
Levam aos que os leem, um sugestionar de que pedem um exceder dentro, para gostarem do que veem, para poder se permitirem o “se amar”, a partir do revelar daquilo que não conhecem como sendo eles em potência.
Como fossem filhos de si mesmos, que antes necessitam serem desenhados, para depois gerados por si, e, assim, trazer pelas próprias mãos o novo, numa condição cheia de significado para o estar vivo, serem seres humanos.
Jovita e Hugo queriam inconscientemente desafiarem o Cosmos, a Harmonia Universal, que podemos chamar de Deus, para que levasse-os a se superarem. Estavam por mais de quinze anos tentando se transcenderem no subjetivo pelas mãos um do outro.
Não haviam passado além do homo sapiens, que os trouxe ao adulto realizado, profissionalmente e socialmente, até que se conheceram naquele grude das mãos na laranja na feira.
Hugo havia chegado aos setenta e cinco anos, Jovita, sessenta. Os filhos tinham tomado seus rumos. Residiam em cidade diferentes, com encontros quinzenais na casa de Jovita, próxima a orla, na cidade litorânea.