O CIRCO

Quando chegou da escola o menino de oito anos soube da novidade: haviam montado um circo no terreno que ficava no fim da rua periférica. Melhor: talvez pudessem ver o espetáculo. A estreia aconteceria em dois dias. Ele debutaria na plateia.

- Precisamos juntar dinheiro – avisou uma das irmãs.

Durante dois dias o menino sonhou de olhos abertos, enquanto brincava sozinho no quintal de cimento áspero. Quando chegava à porta de casa, de longe, via a lona do circo e suspirava, ansioso.

Era um velho circo de pobre, com lona encardida, recheada de rasgões e remendos que provocavam novos rasgões. Ali havia um leão magérrimo, mas de pelo longo e juba imponente, meia-dúzia de malabaristas rotos, mas desenvoltos, e um palhaço, decadente, que ainda assim arrancava risos da criançada e de adultos de coração ingênuo. Mas era circo e isso era o que importava.

Os olhos do menino brilhavam de contentamento e expectativa.

Naqueles dois dias ele antegozou cada detalhe. Imaginou as luzes e cores reduzindo a penumbra da rua pobre. Anteviu o leão e sua juba imponente. Gargalhou solitário com piadas sequer imaginadas. E – sobretudo – viveu a apoteose de entregar o ingresso e sentar na arquibancada rústica à espera do espetáculo, examinando o público em torno à cata de conhecidos.

No dia da estreia as irmãs contaram e recontaram o dinheiro amarrotado e as moedas miúdas. As entradas eram caras demais para eles: não iriam ao circo. Convocaram o menino que veio do quintal de cimento.

- O dinheiro não dá para ir no circo.

A alegria que o menino acalentou por dois dias se diluiu numa dolorosa expressão de desapontamento. As luzes, as cores, o leão e o palhaço, o ingresso que garantia o acesso àquele mundo misterioso e fantástico, tudo se desfez sob a penumbra da tarde nublada. Restaram os olhares desapontados na sala escura da casa pobre.

E o menino voltou ao quintal. Foi chorar, escondido, aquela profunda e comovente decepção...