RELATO DE DESABAFO
RELATO DE DESABAFO
Salvador, BA, 05 de junho de 2018
Ontem, um dia atípico dentro da normalidade. Terminando a primeira parte de uma longa jornada dividida em três partes: estágio, aulas de italiano e aulas de literatura, conversei com os meus colegas, falamos sobre a situação crítica atual da nossa nação e do desconforto em que vivemos, mesmo sem ter escolhido esse cenário. Enquanto as discussões fluíam houveram intervenções interessantes, sempre dos colegas, falamos da criminalidade presente especialmente na nossa cidade, da situação econômica do país, da educação, que diga-se de passagem está última dentro da nossa área de atuação , pois somos todos professores em formação.
Como sempre, seguindo a rotina pegamos o ônibus, e cada um partiu aos seus destinos. Eu, infelizmente ontem tive que mudar a rota, como já disse sou estudante, dependo exclusivamente do transporte público para me locomover, fui recarregar o meu cartão de meia passagem, “benefício” que os estudantes de Salvador tem direito, até aí, tudo dentro da normalidade, um dia como outro qualquer.
Para chegar a minha segunda parte da jornada, precisava pegar um outro ônibus para chegar à universidade, dessa vez sem a companhia dos meus colegas. E tudo foi diferente, todo discurso que havíamos feito, na parte da criminalidade estava acontecendo, como se fosse uma profecia se cumprindo. Como sempre já havia pego o meu cartão, para facilitar a subida no coletivo e não obstruir a entrada, subi no ônibus, coloquei a mochila para trás para não derramar minha boia e nem trincar a tela do meu celular, poucos segundos, frações.
Começou todo tormento, a realidade do discurso estava presente, aqueles poucos segundos na passada da borboleta do bus foi suficiente para que eu fosse furtada, é furtada. Como? Não sei, foram realmente frações de segundos, segundos que mudariam a minha vida, não pelo valor financeiro do aparelho, mas pelo valor sociológico que defendi naquele discurso enquanto conversava com os meu colegas, lembra? Em relação à criminalidade, eu disse e todos concordaram, que a maioria das violências acontecem pela falta de paridade entre as classes sociais. Eu acredito nisso, o discurso foi muito lindo e bem elaborado, afinal todos sabem das desigualdades existentes entre as classes no Brasil, não precisa ser um guru para saber disso.
O problema é quando você também faz parte dessas classes menos favorecidas e é vítima do próprio sistema da desigualdade. Depois desse fracionários segundos na borboleta do ônibus, comecei uma guerra interna existencial, o que defender? O que fazer quando você é a vítima? Eu sou realmente a vítima? O que fazer para mudar o cenário? O que pensar? Como posso me sentir? Claro que o sentimento de ódio me tomou, afinal sou humana e brasileira, não seria estranho que isso acontecesse.
Passei a noite inteirinha pensando no que poderia ser feito, infelizmente não consegui achar uma solução, tenho as minhas ideias, é claro, o ódio talvez tenha passado, o que resta é só a sensação de insatisfação e impotência que aflora em mim cada dia mais e não consigo parar de pensar em soluções e possibilidades, mas não achei resposta para as perguntas, então as deixo para reflexão, afinal cada uma de nós responderá de uma maneira partindo da realidade em que vive. Boa sorte com a sua resposta.
Enquanto isso vivo com a angústia de ser brasileira, impotente e sonhadora.
Adriane Souza Viana