A barata Clotilde

Hoje irei contar-lhes um conto verídico que me ocorreu ontem às duas da madrugada.

Eu já havia ouvido histórias quando criança de uma tal dona aranha que subiu pela parede, mas nunca antes havia escutado que a dona baratinha também sobe pela parede. Aliás, ninguém me disse nada, eu mesmo vi com meus próprios olhos que um dia a terra há de comer. Ela era imensa, do tamanho de um dedo anelar; era bem cascuda; quando andava, podia se escutar por telepatia o saculejar do seu exoesqueleto de quitina fazendo "crack". Suas antenas eram longas, faziam inveja às parabólicas, e suas patas mui fortes, deixariam boquiabertos os alpinistas. Mas por que falo dos alpinistas? Simples. A barata que eu vi, escalou um prédio de TRÊS andares - TRÊS ANDARES? - isso mesmo, TRÊS andares. Invadiu, sem ao menos ser convidada, a cobertura do meu vizinho do prédio ao lado. Certamente ele terá uma grande surpresa ao ver Clotilde (o nome que dei a barata) pela manhã, tomando sol em sua varanda.

Após sua triste ida - já havia eu criado um forte elo com a Clotilde e senti-me muito mal por sua partida - fiquei a pensar.

Minha primeira reflexão foi: "Leonardo, você só pode estar ficando louco! São duas horas da manhã e você está conversando com uma barata que nem está te ouvindo."

Tive que concordar comigo mesmo. Porém, pensando agora, baratas são ótimas companhias. Elas podem parecer nojentas, mas a realidade é que são dóceis e mal compreendidas. Infelizmente, muitos julgam a barata pela aparência, da mesma forma que muitos julgam a aparência de algumas pessoas. A realidade de uma barata parece distante frente a nossa, contudo, quantas pessoas no nosso dia a dia também não são repelidas e pisadas tal como as baratas?

Minha segunda reflexão foi: "como Clotilde conseguiu subir isso tudo sem cair?"

É claro que existe uma explicação científica, mas como bom sentimentalista, procurei entender o lado emocional da Clotilde (hei de concordar com você, caso venha achar que eu tenho um parafuso a menos após ler essa última frase). Clotilde não subiu tudo de uma vez. Clotilde parou em certos momentos, escorregou e por muito pouco não caiu. Ela recuou muitas vezes, mas não desistiu. Pouco a pouco, ela foi subindo, e chegou até lá em cima cansada - imagino! - mas vitoriosa. Ela deve ter sentido medo, deve ter pensado em desistir, porém, a ambição de chegar lá no alto foi mais forte que o temor e a desesperança, por isso conseguiu. Ou seja, ela acreditou em si mesma! Eu mesmo duvidei que ela chegaria lá em cima, mas ela provou pra mim que conseguia.

No fim de tudo isso, já estava eu quase me esquivando da janela, quando do alto vejo Clotilde retornando da sua ida até a cobertura. Fiquei muito feliz em vê-la novamente. Mas essa felicidade foi tomada pelo medo em segundos, pois pouco depois, Clotilde resolveu levantar voo. Eu sinceramente não sabia que baratas poderiam voar tão alto. Fechei a janela rapidamente e a danandinha fez questão de ficar voando em frente a minha janela. Talvez ela queria entrar para tomar uma xícara de chá, mas como já estava muito tarde e como não fica bem receber visitas de madrugada, deixei ela lá fora e dei apenas um "tchauzinho".

Clotilde então se foi, e a vi entrando no basculante do banheiro da vizinha de baixo. Antes de ir dormir, certifiquei-me se meus dentes estavam bem escovados, afinal não queria um beijo da Clotilde, por mais adorável que ela fosse, então deitei-me e fui dormir.

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Seja forte e corajoso(a) como a Clotilde! E a título de curiosidade, baratas são tão fortes que conseguem resistir por 7 dias sem água, dois meses sem comer, semanas sem cabeça e até mesmo resistem a uma catástrofe nuclear.

Leonardo Salomon
Enviado por Leonardo Salomon em 03/06/2018
Reeditado em 16/03/2019
Código do texto: T6354371
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