Marinheiros de primeira...
Os olhos de Serena eram de um azul tão cândido, pareciam o céu numa tenra manhã. Seu sorriso lembrava o sol saindo por detrás das nuvens e esquentando a pele devagar. Ia se formando num crescendo como uma música clássica que é pura harmonia... Eu ficava ali, sentado ao lado do carrinho, olhos rasos d'água. Agradecia a Deus a oportunidade de ver minha primeira netinha. Não esperava que fosse tão cedo, mas tinha certeza que era a hora certa! Na época em que criei as minhas filhas, trabalhava doze horas por dia. Saía para o trabalho e as deixava dormindo, voltava para casa e beijava a fronte de cada uma, já adormecidas. Nos fins de semana sim, íamos à missa e depois almoçávamos juntos. À tarde tinha o futebol na TV ou cochilava para compensar a jornada pesada da semana. Os anos se passaram e agora, eu já ancião, teria tempo para passear ao sol, brincar no chão, pular amarelinha... Tenho as horas que não pude dar à elas. A vida me renova a chance.
Olhando a mocinha fazer beicinho, julguei que o sol estava forte e também já era a hora da próxima mamadeira.
Voltei da pracinha feliz. Ao cruzar o portão, a vovó foi logo apanhando a menina no carrinho e resmungou:
- Vem trocar a fralda dela!!! Pelo menos uma na vida!
Entrei na sala, peguei o jornal, abri e fingi não ter ouvido a indireta. Tudo igual como fiz há vinte e cinco anos atrás.
Cláudia Machado
1/6/18