Ausência
Fazia dois meses que ele se fora. Mas a foto na cabeceira mantinha a sua presença. O quarto ficou fechado com todos os seus pertences. Nada seria tocado.
À tarde, sentava-se defronte a janela e olhava o pôr do sol. Fazia uma prece e usava um lencinho de voal bordado, presente de enxoval. Ela fez questão de guardar, tinha também a roupa do batizado, os dentinhos incisivos central e um babador.
Gostava de lembrar...o primeiro dia na escola, o dia que correu com ele para o hospital, um talho enorme na testa e o seu choro aflito por causa dos quinze pontos que ela sentiu, um a um.
A primeira namorada, a bronca do pai quando chegou com o carro batido, às escondidas... Mas ela conseguiu que o marido relevasse, afinal, ele era um bom menino.
Sempre teve boas notas, medalha de ouro na universidade! Motivo de orgulho para toda a família e agora aquela falta... a casa era só silêncio... o rock no fim da tarde, e a zoeira no banheiro. Parecia ainda tão criança...
Ela não havia se preparado, aliás quem se prepara? Guardou o terço, fechou a cortina e limpou as lágrimas.
Uma bolsa de estudos no exterior era mais do que merecido. Seriam os seis meses difíceis da sua vida, mas passariam. E era melhor que se acostumasse, dizia o marido, pois ele logo mais se casaria...
Cláudia Machado
30/5/18