ISMÁLIA

Estava quase sempre dentro de sua própria cabeça e talvez isso fosse ruim, pois sua cabeça era um labirinto sem fim. Era como aqueles caminhos que dão sempre noutro caminho, numa ruazinha que dá para uma viela e nunca chega, ou quando chega, chega em um lugar que não era para onde iria lá no início quando começou a caminhar. E agora, os calores noturnos eram também diários. E pior que eles eram os suores tão desagradáveis como sempre os imaginou nos outros. Vivia da confirmação das hipóteses da juventude. Tudo que imaginara ruim, de fato era. E esse era o tipo de sabedoria que de nada lhe servia. Sua cabeça era cheia de inutilidades feito o quarto de despejo onde se despejam as quinquilharias da família. As relíquias imprestáveis que o tempo desvalorjzou. O tempo é isso o desvalorizador de coisas e pessoas. Pensou. Às vezes pensava. Parece absurdo essa afirmação, mas o fato é que eram tantas imagens com e sem texto, palavras soltas, onomatopeias de emoções sentidas. Tudo transitando solto em sua cabeça naquele movimento antigravitacional, flutuando diante de seus olhos, que se questionava se isso tudo era mesmo pensamento ou pura distração. Ora medo, ora solidão. Tudo sendo suscitado. Suscitado por quem? Era a mente que a perseguia ou a vida que trazia recorrentes imagens preocupantes, precipício para a loucura. Lembrava- se agora de Ismália querendo as duas luas. No céu e no mar. Concluiu: O problema são os quereres sem poderes.

Adelaide Paula
Enviado por Adelaide Paula em 20/05/2018
Reeditado em 20/05/2018
Código do texto: T6341778
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