SEREIA

O mar quando quebra na praia é bonito, é bonito. Esse foi o trecho de um livro que eu li há muito tempo quando eu ainda era um mancebo, por tal motivo, quem me dera lembrar o nome. Mas a história que vou contar não é a mesma deste texto que há muito tempo eu tivera lido. Apesar do cenário ser o mesmo, essa história é outra, não há Maria de Chica, que era bonita e que endoideceu, mas há muitas Marias que também perderam seus maridos. E começa assim:

Um pescador vivia numa colônia não muito grande. Sua maior riqueza era o pequeno catamarã de dois lugares que se lançava sobre os mares no afã de trazer o sustento para esposa e filho. Todos os dias pela manhã, muito cedo, até mesmo sem se despedir da família, o pescantim colocava a rede nas costas, o safari surrado na cabeça, um litro de aguardente na mochila e saia para pescar. Sempre sozinho, apesar da embarcação promover lugar para duas pessoas.

Certo dia de manhã saiu como de costume e remou para alto-mar. Não era um dia ruim. O céu estava limpo, o sol a pina, ventos fracos, uma boa condição para enfrentar a labuta diária sem muita dificuldade. Mas aquele dia algo inusitado lhe aconteceu. Não viu nada de errado, mas ouviu algo tão harmonioso e envolvente que nem sentiu o perigo que se aproximara. A embarcação chocou-se contra o rochedo e a nado chegou à márgem da praia de uma ilha distante do vilarejo onde morava.

Embora exaurido pelo cansaço da luta para alcançar a praia continuou a escutar tão bela canção que vinha de uma gruta escura, grande e banhada pela água do mar. A curiosidade o conduziu para a entrada da gruta onde pôde enxergar a figura feminina detentora de tão belo canto, mais do que isso, o rosto lindo, os olhos verdes, os cabelos longos e loiros, os seios fartos e uma silhueta da cintura para cima tão perfeita que foi impossível de não atender ao chamado daquela deusa com parte do corpo embrenhada na água de modo que não podia ser visto.

O pescador enfeitiçado pela sereia e inebriado pelo desejo de tê-la para si naquele momento e naquele lugar, não pensou nos peixes nem na família, mas pensou que jamais alguém pudera um dia desconfiar daquele segredo pecaminoso. Aproximou-se da jovem que para ele estendeu a mão e puxou-o para perto de sí e em poucos instantes o afogou nas águas mais profundas daquele pedaço de oceano.

A sereia ainda vive e canta.

O padeiro, o motorista, o executivo e muitos outros, sem exceção, naufragaram em mares distantes e também deixaram de voltar para suas casas e para o seio de suas famílias.

Paulo Roberto Fernandes
Enviado por Paulo Roberto Fernandes em 13/04/2018
Reeditado em 14/04/2018
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