"Alegriste"
O silêncio era a mais barulhenta das músicas. O tempo era o paracetamol para certas dores de cabeça que aleijavam o abismo peitoral, mas em contrapartida só ajudava a alastrar ainda mais as feridas. A vida não sorria mesmo que lhe fizessem cócegas, mesmo que a morte viesse e contasse das suas mais matantes piadas e se adiasse.
As pessoas cometiam um grande erro ao lhe atribuirem valores que não possuía. O Luis, coitado, não decepcionava ninguém. Não sentia amor nem fazia. Sua sensibilidade não tinha dinâmica, sua tristeza era estática. Não mudava de lugar nem se eliminava. Tudo era quente como brasa seduzida por uma ventania ninfomaníaca.
A vida já fora escola. Mais tarde tornou-se uma prisão. Era recluso dos sonhos onde estava deslocado, sonhos estes que lhe roubavam a identidade aos poucos e cortavam toda a electricidade da sua calma.
Já respondia mal às pessoas, por estar aborrecido com o sistema político que promovia pobreza. O desafio era, para quem tem os pés bem firmes na terra, perseguindo seus sonhos, fossem quais fossem, não mais pensar em despachar bolinhos ou água nas ruas, a água da qual ninguém pode fugir para sempre.
É um óptimo negócio. O petróleo custava caro porque era valioso. A luz também, e o ouro. O carapau não passava mais na zunga, e nenhuma das mulheres que via poderia substituir aquela que um dia foi a dona da sua masculinidade.
Mas Luis não estava frustrado. Só precisava de ver os resultados dos cálculos das suas lutas a baterem certo. Todavia, não era do tipo de pessoa que pensava apenas em si mesmo. Lutava mais do que para o seu bolso, mais do que para a sua barriga, para que ninguém fosse mendigo. Para que os boelos deixassem de pensar no ridículo, como quem ousa afirmar que em países como os Estados Unidos da América pessoas recebem dinheiro de graça. Não, Luis Valsi não acreditava na preguiça. Detestava a violência psicológica e um dos seus grandes intentos era ver florir nas arestas da tal dita paz, um povo que não sofresse da doença "morrer para enriquecer quem já tem demais".
O amor era a sua arma, arma que o matava, porque o amor também passou a custar caro demais, e ele nunca teve dinheiro suficiente para comprá-lo. Também porque o amor não se compra nem se cobra. O amor já era cobra que mordia os cofres de quem apenas respirasse pompa.
Jovem pobre. Nas suas algibeiras direitas só fazia morada dinheiro para comprar CDs. Apaixonado por leitura e música para todos os santos dias, mais ainda para os sem santidade.
Era a sua terapia preferida contra a alegria triste que lhe dava cabo dos músculos. Mas o homem era rico por não precisar de mais nada além de ser feliz, ainda que implicasse, isso, ir ter mais cedo com a Morte, uma prostituta tesa que persegue os clientes.
A tristeza era o seu estado de espírito para fazer tudo como ordenavam as regras. Valsi não era feliz, o que era bom na mesma, porque só assim conseguia ter sucesso na vida.