A razão de viver?
Todos os dias Janaína saía, punha o lixo na rua, comida para os gatos, trocava a água dos bebedouros para os passarinhos na varanda, fazia um afago no cachorro e caminhava até o ponto de ônibus.
Da minha janela eu a observava. Como Janaína era cuidadosa!
Vivia sozinha, num quartinho daquele sobrado. E eu, não compreendia porque nunca a via acompanhada.
Um dia me enchi de coragem, coração até meio trêmulo, desci para a calçada e fiquei por ali, como quem não quer nada, esperando a menina passar.
Ela não desconfiava que eu era o seu vigia e, da minha janela, noite e dia, sabia a hora que saia e que chegava.
Ouvi o barulho de portão velho rangendo e, me virei já com um sorriso pronto, para interpelar a jovem moça.
Mas para meu desatino, atravessou aquele portal um homem magro, talvez ainda jovem com um aspecto muito envelhecido.
Não pôs água para os pássaros, nem o lixo na lixeira. Não havia qualquer gato acompanhando o tal sujeito.
O cachorro estava deitado na varanda e, nem o focinho levantou quando o rapaz passou.
Estranhei a falta da morena e tomei uma dose extra de coragem.
- Bom dia! Como vai a Janaína?
O rapaz olhou pra mim e disse num tom muito triste.
- Era minha prima. Vim buscar uma muda de roupa... Ontem ao atravessar a rua, não ouviu a buzina. Coitada da Janaína, era muito boazinha...
Meus olhos se encheram d'água, como pôde acontecer?
Eu vivia a espreitar a razão do meu viver!
Mas não pude evitar... não vi Janaína morrer!
Cláudia Machado
3/3/18